O BOTECO COMO UM DIVÃ DE
ANALISTA
Rafael Rocha é jornalista e editor-geral
deste Humanitas. Atua no Recife/PE
Mês de maio. Mês do botequim. Parabéns para
todos os que bebem nesses templos. A vida está complicada demais e o boteco
serve como um local de expiação dos pecados e dos recalques.
Serve como válvula de escape. Os amigos
estão lá, esperando. Eles serão os nossos analistas e psicólogos.
Sendo mais sincero ainda, eles também não
sabem o que fazer porque tal e qual os demais estão a expiar seus problemas
íntimos bebendo cerveja, dando arrotos, bebendo cachaça e brindando a qualquer
coisa que possa lhes mostrar que estão vivos.
O fato é que estamos todos a beber demais.
Homens e mulheres irmanados na busca de algum fato que faça com que todos
possam fugir do lugar comum.
Fato raro mesmo é a sobriedade.
O boteco é o lugar mais conveniente para
falar de coisas que não podem ser ditas em casa. Nele, os frequentadores podem
malhar a vontade a vida alheia, pois Baco sempre irá perdoar isso.
Nele, podemos ser analistas políticos,
analistas esportivos, analistas educacionais, músicos, cantores, poetas.
Não importa por qual partido político
alguém tenha simpatia.
Não importa por qual time de futebol se
torça.
Não importa a falta de ritmo musical.
O boteco é um espaço único onde se
apresenta a sabedoria política e esportiva de cada um, a arte humana de cada
um, a educação de cada um.
É um espaço democrático, ainda que a grande
sucessão de fatos negativos acontecendo em nosso país provoque reações das mais
primitivas em alguns dos seus frequentadores, embotando seus argumentos e
juízos.
A internet e as redes sociais disseminam as
notícias de segundo a segundo e até no boteco essa velocidade atropela as
análises mais legítimas, ainda que elas nada mudem. Apenas satisfazem aos que
participam da conversa ou discussão como se todos estivessem em um tribunal
inquisitorial.
No caso das mulheres que frequentam o
espaço, elas não suportam muito as digressões e conspirações dos homens.
Claro que elas entendem a gravidade da
conjuntura nacional política, educacional, de segurança pública, até mesmo de
futebol, mas nunca a necessidade masculina de comentar, analisar e apresentar
soluções que jamais serão as soluções delas.
Mas,
deixa pra lá! A realidade nua e crua é que no boteco temos, assistimos e
participamos de uma novela surreal, com muita intriga, muitos gritos, muita
música, muita cerveja, muita cachaça, muitos bêbados e pouquíssimo sexo.
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