sexta-feira, 31 de agosto de 2018

HUMANITAS Nº 75– SETEMBRO DE 2018 – PÁGINA 7

QUANDO AS CRIANÇAS BRASILEIRAS SERÃO RESGATADAS DA MISÉRIA?
Ana Maria Ferreira Leandro é escritora e jornalista. Atua em Belo Horizonte/MG

Em todo o mundo não houve povo que não se unisse para desejar o resgate das crianças tailandesas, que se viram de repente presas numa caverna de grande profundidade abaixo do mar. De fato, este grupo de crianças que provavelmente passou por uma difícil experiência, num alto risco de perda da vida, mas demonstraram ser corajosos ostentando sorrisos para suas famílias quando ainda presos na caverna.
É preciso reconhecer que estavam na companhia de um instrutor/educador, que os proveu de um treinamento no uso direcionado da mente, para resistirem às intempéries de uma caverna com dificuldades respiratórias e ambientais.
Especialistas em mergulho em cavernas, os “espeleologistas” e mesmo pessoas de apoio geral (produção de alimentos para os envolvidos etc) se colocaram como voluntários na difícil tarefa de fazer o salvamento das crianças e o instrutor.
Registre-se uma perda importante de um dos voluntários, que lamentavelmente até perdeu a vida na tentativa de prestar sua ajuda no processo. Mas apesar da dolorosa perda, a operação total foi exitosa e as treze pessoas que se encontravam na caverna foram salvas e devidamente cuidadas no pós-salvamento. Podemos dizer que foi uma experiência mundialmente envolvente.
E fico me perguntando, por que não nos preocupamos com a legião de crianças no Brasil, ao relento ou em condições precárias de moradia, sem desenvolvimento educacional, à mercê da fome e da total desestruturação de vida.
Falta de saneamento e outras condições básicas de sobrevivência é a realidade de muitos, que morando em casas de tábuas e papelão enfrentam os rigores da miséria.
Mas num país em que até a merenda escolar de crianças é roubada por adultos, que ocupam cargos de lideranças institucionais e políticas, o que mais se pode esperar? 
Resta-nos o lamentável entendimento, que todo o espetáculo de sensibilizaçâo de grande parte de nossa gente é mero exibicionismo de uma solidariedade fingida!
De fato, para exibir como num palco de teatro uma capacidade de sensibilização é comum ouvirmos discursos e palavras de valorização da infância.
Tudo mera exibição, teorias sem aplicação, porque na hora de atuarem na solução dos problemas da miséria, roubam a alimentação de crianças na escola.
Isto praticado muitas vezes por pessoas escolhidas por nós em eleições, mas participam também deste processo hediondo de corrupção!
E se uma vez chamados a responder por tais ações (quando chamados), em esticado processo condenatório acabam se safando da prisão de onde deviam estar desde antes, para não roubarem e usarem sua própria gente em seus atos espúrios.
Quando iniciaremos o processo de resgate de nossa gente?!
Muita gente de todas as idades morre nas ruas por total falta do que nos garante a Carta Magna: saúde e segurança!
Por que não nos horroriza saber que crianças estão com fome, enquanto outros que tudo têm estão roubando de muitas delas?
Por que não nos vemos na obrigação de resgatar essas crianças e não apenas os próprios filhos? A ação voluntária do resgate na Tailândia chega a nos causar vergonha, diante da referência humana que nos dão.
Vergonha das precárias condições de nossos irmãos, que não conseguiram escapar da miséria.
E nenhum plano ou projeto é estabelecido para este resgate, que mata muito mais que guerras.
Provavelmente porque os holofotes da imprensa e da comunicação não se refletem sobre eles.
Os discursos políticos são todos plenos de promessas para ações deste resgate. Mas dissolvem-se em seus exercícios como gelo, talvez fabricado na frieza de suas mentes e corações, próprios de quem só se preocupa em exorbitar seus próprios ganhos.
Uma vez eleitos não há preocupação com o cumprimento de promessas; que por sua vez não são cobradas pelos que os elegeram.
Uma vez explicitado sobre as difíceis condições econômicas do próximo governo (uma vez que o atual nada fez), pergunto-me por que as lideranças políticas de nossas instituições, não se propuseram não somente a uma adequação de seus ganhos exorbitantes, ou à redução de seus “benefícios”.
São detentores de ganhos que um trabalhador de salário mínimo não alcança nem em toda sua vida, como “auxílio moradia” e outros, que nem é possível relatar todos numa página jornalística. 
Lamentavelmente estamos errando todos, por não termos competência para resgatar nossa própria gente!

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