sexta-feira, 8 de março de 2019

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PRIMEIRA PÁGINA

O MUNDO INTEIRO RENDE HOMENAGEM ÀS MULHERES

A mulher é uma guerreira. É quem mais luta pelos seus ideais. Ser mulher é não ter medo, porque ela muda o mundo. Ela tem o poder. Não é o gênero que define uma mulher, mas a pessoa que ela é ou virá a ser.  Hoje, a mulher está presente em tudo. Conquistando mais espaços. Ganhando respeito. Sonhando mais. Cada conquista feminina se multiplica em todos os quadrantes do planeta.
PÁGINA 8
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A PÁGINA 4 apresenta texto sobre Leila Diniz
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O escritor Araken Vaz Galvão disserta, na PÁGINA 6,
sobre lembranças, aplausos e admiração
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O Refúgio Poético, na PÁGINA 3, traz poemas de Josefina
Álvares de Azevedo e de Alice Ruiz
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Carnaval é a festa dos prazeres mundanos - PÁGINA 5

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PÁGINA DOIS

EDITORIAL

Fragilidade é força

O dia 8 de Março é, desde 1975, comemorado no mundo como o Dia Internacional da Mulher.
Nesse dia - em 1857 - operárias de Nova Iorque entraram em greve, ocupando uma fábrica, para reduzir o horário de mais de 16 horas por dia para 10 horas.
Essas operárias - que recebiam menos de um terço do salário dos homens - foram fechadas na fábrica, onde aconteceu um incêndio e 130 delas morreram queimadas.
Já foi comprovado que a mulher sofre discriminação, principalmente na parte profissional. Ainda que seja competente, quando ocupa o mesmo cargo de um homem, seu salário é menor.
No entanto, a culpa disso não é somente dos homens, pois essa discriminação existe também por parte das próprias mulheres. Uma mulher, quase sempre não confia em outra para exercer um cargo importante e de confiança.
A mulher soube galgar e conquistar degraus na escada da vida, profissional, familiar e pessoal. Assim, ela nunca deve tentar se impor pela força, querendo mostrar "igualdade" com os homens, pelo contrário, deve fazer questão de ser sempre o "sexo frágil"
Este Humanitas se congratula com as mulheres e lembra que "fragilidade", não significa fraqueza, mas "sensibilidade".
A mulher inteligente deve fazer questão de ser considerada como um "vaso raro e frágil", para ser tratada com respeito, com carinho, com amor, com cuidado, e é nesse momento que ela mostra a "força" que tem.
A mulher não precisa de um dia específico. Todos os dias são dias das mulheres, pois elas estão vivas e atuantes!
Parabenizamos a mulher em todos os dias, em todas as horas, em todos os minutos e em todos os segundos, porque ela é sempre "mulher" o tempo todo.

Mulher: a luta pelo direito de “ser”
Ana Maria F. Leandro - Belo Horiznte/MG

É indispensável sempre lembrar e reconhecer o que a mulher sofreu na sociedade e na sua luta pelo “direito de SER”.
Fato oriundo de um sistema onde o homem é que tinha a autoridade, por influência da Igreja em conluio com políticas governamentais desde a Roma antiga.
A “Inquisição” foi o evento da história mais punitivo do gênero feminino. Pelo simples ato de demonstrar um conhecimento diferenciado dos homens ou do governo, a vítima era acusada de “bruxaria” sofrendo terríveis condenações, torturas e morte.
A Inquisição foi criada em 1233 pelo papa Gregório IX para combater o que denominava heresia. Somente em 2000, o Papa João Paulo II reconheceu os diversos erros e pediu perdão pelas iniquidades cometidas pela Igreja Católica.
Mas o processo de tirar da mulher o direito até de se expressar foi além da Inquisição. Grandes mulheres da história, que não se continham e se manifestavam, de forma explícita e declarada sofreram por isso.
Até o início do século XX, o voto, na maioria dos países, era um direito exclusivo dos homens – e ainda assim definido por fatores de status econômico e social. Foi já no século XX, que ativistas do gênero feminino se mobilizaram pelo direito à participação política e ficaram conhecidas como sufragistas.
Por absurdo que pareça, até hoje a ideia de que a mulher deva “apenas obedecer sem se manifestar”, continua em voga.
Existem casos de mulheres que passaram anos encarceradas pelo próprio pai, sem direito a sair de casa e sendo regularmente violentadas pelo mesmo.
Já houve muita alteração nessa realidade, mas são fatos atuais. Muitos homens não perceberam que a convivência se torna muito melhor, quando na parceria há diálogo, respeito recíproco por pontos de vista diferenciados.
No mercado de trabalho a mulher ainda sofre diferenciação e preconceitos. As empresas insistem em negar o fato no discurso, mas não na prática. Em relação aos salários, as mulheres têm renda anual média inferior à dos homens. A diferença ocorre mesmo quando a mulher tem anos a mais de estudo.
As mulheres contemporâneas precisam identificar que o avanço alcançado é consequência da ação individual, do enfrentamento, da decisão de evoluir, de buscar o melhor de si.  
Para “SER” é preciso mais que viver. É necessário também crescer e buscar educação, melhoria da escolaridade e do conhecimento, que proporcionam a superação dos obstáculos, e que se fazem essenciais para as conquistas humanas de qualquer que seja o sexo.

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PÁGINA TRÊS

Refúgio Poético – Cartas dos Leitores – Teste de Xadrez

Josefina Álvares de Azevedo
(Recife, 5 de maio de 1851
Rio de Janeiro, 2 de setembro de 1913)
Jornalista, escritora e precursora do feminismo no Brasil.

Ao rugido medonho da tormenta
Que a alma nos esmaga, nos trucida,
Não pensem que maldigo a triste vida
Nem o sopro de Deus que ora me alenta.

Nem um momento só sou esquecida
De quem criou o mundo e aviventa
A flor do prado, a fera mais cruenta,
A tudo, enfim, que tem ou não tem vida.

É doce nas agruras da existência
Lembrarmos a divina onipotência,
Erguermos para o céu o coração!

Naquele terno enlevo de fé pura
É sempre mui feliz a criatura
Que forças vai buscar no coração.
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Drumundana - Alice Ruiz
É uma poetisa e tradutora brasileira
Vencedora do prêmio Jabuti no ano de 2009.

E agora, Maria?
O amor acabou
a filha casou
o filho mudou
teu homem foi pra vida
que tudo cria
a fantasia
que você sonhou
apagou
à luz do dia
E agora, Maria?
vai com as outras
vai viver
com a hipocondria
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CARTAS DOS LEITORES
 
Parabéns ao jornal pelo belo trabalho que realiza sendo uma alternativa plausível para os leitores que são humanistas, e que cada vez mais têm se indignado com os caminhos que tomou a comunicação em nosso país. Gostei do desabafo da escritora Divina de Jesus Scarpim na edição de janeiro 2019 sobre o material pedagógico distribuído nas escolas pelo governo. Contundente! Danielle Lourenço – Caruaru/PE

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PÁGINA QUATRO

A mulher que contestou o
machismo nos anos 1960/1970
Especial do HUMANITAS

A atriz fluminense Leila Roque Diniz morreu jovem, aos 27 anos de idade. Mas sua curta trajetória no mundo foi marcante e fez com que ela se tornasse a jovem símbolo da revolução feminina no país.
Ainda hoje, os posicionamentos de Leila são recordados como fundamentais para a quebra de vários tabus e na mudança da sociedade do final da década de 1960 e início da década de 1970, ainda fortemente marcadas pela aceitação do machismo e do sistema patriarcal.
Leila morreu em um trágico acidente aéreo na Índia em 14 de junho de 1972. Ela voltava de uma viagem à Austrália, onde tinha sido premiada em um festival de cinema, quando o avião da Japan Airlines explodiu, próximo a Nova Delhi.
Nascida em Niterói em 25 de março de 1945, a atriz começou como professora e chegou a trabalhar com crianças em um jardim de infância. Com 20 anos de idade, ela já interpretava e conseguiu o papel de protagonista na primeira produção de novela da TV Globo.
Participou também no cinema nas comédias de Domingos Oliveira, com quem foi casada por três anos, e dos filmes experimentais de Nelson Pereira dos Santos, além de atuar no teatro.
Em 1969, com uma toalha amarrada na cabeça, Leila Diniz concedeu uma entrevista de capa ao jornal “O Pasquim”, revelando abertamente suas posições sobre relacionamento, sexo e fidelidade.
Sem papas na língua e claramente à frente de seu tempo, foi nessa reportagem que ela soltou algumas de suas afirmações históricas: “Você pode amar muito uma pessoa e ir para a cama com outra. Já aconteceu comigo” e “No fundo, eu sou uma mulher meiga, adoro amar, não quero brigar nunca e queria mesmo ficar fazendo sexo sem parar”.
Meses após a publicação da entrevista, em meio à ditadura militar, foi aprovado o Decreto 1077, conhecido por Decreto Leila Diniz, em que se instaurava a censura prévia à imprensa em todo o país.
Nessa época, Leila foi perseguida politicamente e chegou a perder contratos profissionais, precisando se esconder no sítio do apresentador Flávio Cavalcanti para preservar sua vida.
Em 1971, grávida de Janaína, filha que teve com o cineasta Ruy Guerra, a atriz colocou um biquíni – considerado pequeno para os padrões da época – e se deixou fotografar na praia de Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro.
A fotografia foi estampada em inúmeros jornais e revistas.
Naquele tempo, as grávidas, quando iam à praia, usavam uma cortina para esconder a barriga.
O corpo grávido à mostra consolidou Leila Diniz como precursora das transformações da condição feminina.
Com a imagem, a atriz despertou questões relacionadas à libertação da vida sexual, e também enfrentou estigmas e proibições associadas ao corpo da mulher, mas ainda assim foi eleita mais tarde como a Grávida do Ano no programa do Chacrinha.
Quando Janaína nasceu, a atriz provocou uma nova polêmica ao amamentar sua filha diante das câmeras de TV.
Sua morte precoce no ano seguinte fortaleceu sua imagem de mulher libertária que prevalece até hoje.

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PÁGINA CINCO

Carnaval: a festa dos prazeres mundanos
Texto extraído de Brasil Escola - brasilescola.uol.com.br/carnaval
Especial para o HUMANITAS

O carnaval é a festa mais popular do Brasil que, ao longo do tempo, tornou-se elemento da cultura nacional. Mas não é invenção brasileira nem realizada apenas aqui. A História do Carnaval remonta à Antiguidade, tanto na Mesopotâmia quanto na Grécia e em Roma.
Carnaval vem do latim, carnis levale, cujo significado é retirar a carne. O significado está relacionado com o jejum que deve ser realizado durante a quaresma e com o controle dos prazeres mundanos. Uma tentativa da Igreja Católica de enquadrar uma festa pagã.
Na antiga Babilônia, duas festas possivelmente originaram o que conhecemos como carnaval. As Saceias era uma festa em que um prisioneiro assumia durante alguns dias a figura do rei, vestindo-se como ele, alimentando-se da mesma forma e dormindo com suas esposas. Ao final, o prisioneiro era chicoteado e depois enforcado ou empalado.
Outro rito era realizado pelo rei nos dias que antecediam o equinócio da primavera, período de comemoração do ano novo.
O ritual ocorria no templo de Marduk, um dos primeiros deuses mesopotâmicos, onde o rei perdia seus emblemas de poder e era surrado na frente da estátua de Marduk. A humilhação servia para demonstrar a submissão do rei à divindade. Depois, ele novamente assumia o trono.
O que havia de comum nas duas festas e que está ligado ao carnaval era a subversão de papéis sociais: a transformação temporária do prisioneiro em rei e a humilhação do rei frente ao deus. A subversão de papeis sociais no carnaval, homens vestindo-se de mulheres e vice-versa, pode encontrar suas origens nessa tradição mesopotâmica.
As associações entre carnaval e orgias podem se relacionar às festas greco-romanas, como os bacanais (festas dionisíacas, para os gregos).
Seriam festas dedicadas ao deus do vinho, Baco (ou Dionísio, para os gregos), marcadas pela embriaguez e pela entrega aos prazeres da carne.
Havia ainda em Roma as Saturnálias e as Lupercálias. As primeiras ocorriam no solstício de inverno, em dezembro, e as segundas, em fevereiro, que seria o mês das divindades infernais, mas também das purificações. Tais festas duravam dias com comidas, bebidas e danças.
Os papéis sociais também eram invertidos temporariamente, com os escravos colocando-se nos locais de seus senhores, e estes se colocando no papel de escravos.
Mas tais festas eram pagãs. Com o fortalecimento de seu poder, a Igreja não via com bons olhos as festas.
Nessa concepção do cristianismo, havia a crítica da inversão das posições sociais, pois, para a Igreja, ao inverter os papéis de cada um na sociedade, invertia-se também a relação entre Deus e o demônio.
A Igreja Católica buscou então enquadrar tais comemorações. A partir do século VIII, com a criação da quaresma, tais festas passaram a ser realizadas nos dias anteriores ao período religioso.
A Igreja pretendia, dessa forma, manter uma data para as pessoas cometerem seus excessos, antes do período da severidade religiosa.
Durante os carnavais medievais no século XI, no período fértil para a agricultura, homens se fantasiavam de mulheres e saíam às ruas e campos durante as noites. Diziam-se habitantes da fronteira do mundo dos vivos e dos mortos e invadiam os domicílios, com a aceitação dos que lá habitavam, fartando-se com comidas e bebidas, e também com os beijos das jovens das casas.
Durante o Renascimento, nas cidades italianas, surgia a commedia dell'arte”, teatros improvisados cuja popularidade ocorreu até o século XVIII. Em Florença, canções foram criadas para acompanhar os desfiles, que contavam ainda com carros decorados, ostrionfi”. Em Roma e Veneza, os participantes usavam a bauta”, uma capa com capuz negro que encobria ombros e cabeça, além de chapéus de três pontas e uma máscara branca.
A história do carnaval no Brasil iniciou-se no período colonial. Uma das primeiras manifestações carnavalescas foi o entrudo, uma festa de origem portuguesa que na colônia era praticada pelos escravos. Depois surgiram os cordões e ranchos, as festas de salão, os corsos e as escolas de samba. Afoxés, frevos e maracatus também passaram a fazer parte da tradição cultural carnavalesca brasileira. Marchinhas, sambas e outros gêneros musicais também foram incorporados à maior manifestação cultural do Brasil.

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PÁGINA SEIS

Tarde demais...
Araken Vaz Galvão escritor e membro da Academia de Artes do Recôncavo. Atua em Valença/BA

Ultimamente, tenho-me lembrado mui amiúde de um poema de Mário Quintana, cujo título, se a memória não me trai – coisa que ela me vem fazendo também mui amiúde, nesta curva da minha idade – chama-se “Vida”.
Por já não possuir mais aquela mente prodigiosa em decorar letras de músicas e poemas, raramente me recordo do poema completo, agora, por exemplo, lembro-me apenas dos versos iniciais: “Quando se vê, já são seis horas!/ Quando se vê, já é sexta feira.../ Quando se vê, já terminou o ano.../ quando se vê, passaram-se 50 anos!”. 
Não preciso realçar a amarga ironia que estes versos contém – o que sempre caracterizou a obra de Quintana –, porque o que me preocupa, é a insistência com que – praticamente todos os dias – os versos vêm a minha mente.
Penso neles com uma pertinácia atroz, indiferente ao sacolejo que o carro impõe ao meu velho corpo trafegando pelas ruas de calçamento irregular de paralelepípedos.
Aliás, não deveria estar pensando neles, os versos, e sim, no cheiro quase sufocante das flores. Ou melhor, das consequências que poderão advir, já que sou alérgico a perfumes e seria engraçado se me viesse uma crise de espirros...
Claro que o insólito seria um edema de glote. Já pensou se morro? Outro motivo no qual deveria preocupar-me – eu que sou tão calorento – era com este ar abafado (misturado com o perfume das flores), o qual não me permite respirar livre e pausadamente. colocaram...
Esse ambiente está quase me asfixiando, entretanto, e apesar de todo esse calor, do ar abafado, do olor sufocante das flores, sinto-me frio, quase gelado, mas os versos de Quintana, seu caráter de premonição, não me abandonam. 
“Agora, é tarde demais para ser reprovado.../ Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade,/ eu nem olhava o relógio./ Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo/ caminho, a casca dourada e inútil das horas.” 
Não olhar o relógio... Lembro-me que costumava dormir com o relógio no pulso. Não sei se o fazia como um autômato, ou se com algum propósito específico, ainda que oculto.
Não sei. Sei que olhava as horas, mas nunca parava para olhar a vida, vê-la passar de mansinho, de parar para ver um pôr do sol, admirar a luz da lua ou o brilho furtivo das estrelas, deixar o vento bater no meu rosto.
Corria. Apenas corria como desesperado para frente. Atravessava as ruas e avenidas por entre os carros, sem respeitar ou obedecer aos sinais. Driblando ônibus e automóveis, com uma irresponsabilidade arrogante, típica da juventude.
Quanta coisa estúpida não se faz na vida, em particular quando se é jovem... O pior é que só se descobre a inutilidade de tudo quando não se tem mais vigor para fazer nada de útil...
Talvez o melhor fosse dizer que só se tem vigor para ficar no ócio, quando já não se consegue fazer nada. Poderia repetir as palavras de Quintana: 
“(...) Dessa forma eu digo:/ Não deixe de fazer algo que gosta devido à falta/ de tempo, a única falta que terá, será desse tempo/ que infelizmente não voltará mais.” Não voltou para o poeta; não voltará para mim, para ninguém.
Acabaram de me retirar do carro e estão me transportando para algum lugar. Se ao menos eu pudesse abrir os olhos, ver um pouco de luz, sentir a brisa. 
“A brisa que agitava as folhas verdes / fazia ondular as negras tranças”. Onde ficaram perdidos estes versos de Castro Alves?
Onde ficou perdida minha infância?
Meus irmãos, meus avôs, minha mãe, onde estarão?
A fazenda Veneza, o abieiro, a groselheira, o burro Cabrito, onde estarão?
Tomar leite na hora da ordenha, com o calor fumegante do úbere das vacas. Caçar saracuras por entre os lírios-do-brejo, chupar laranja cravo ou caju, comer jaca.
De onde me vêm essas lembranças?
A ingazeira se debruçava por sobre o remanso que o riacho fazia – era a nossa piscina – do alto dos seus galhos pulávamos n’água, para subir e repetir a brincadeira vezes sem conta.
Meu pai morreu muito cedo, quando eu tinha apenas quatro anos – o que é muito cruel, pois quase não me lembro de suas feições, só do afeto que ele nos dedicava.
Mas isso é tão pouco...
Ser amado só não é tudo, é preciso que nos lembremos do brilho nos olhos de quem nos ama, quando nos estão amando.
Minha mãe morreu aos 96 anos...
Agora começo a descer. Será que me colocaram em um elevador? Para onde me levam? Que estranho... Escuto palmas. Por que me aplaudem?
Eu, que durante toda a minha vida tanto desejei ser admirado, de ser – até mesmo discretamente – aplaudido, mas nunca recebi um só gesto de admiração, que só recebi vaias mesmo quando acreditava ser digno de um pequeno afago, sempre vaias, principalmente da vida. Por que tantos aplausos? Por que me dão na morte o que me negaram na vida.
Será que não veem que agora é tarde demais?

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PÁGINA SETE

As duas cidades libertárias ficam mais idosas
Especial do HUMANITAS

Uma metrópole histórica, moderna, líquida e vanguardista. Assim é a cidade do Recife, capital do estado de Pernambuco, que neste 12 de março de 2019, completa 482 anos.
Construída em cima do mangue e cortada pelos mais diversos rios, cujos principais o Capibaribe e Beberibe, juntam-se por trás do Palácio do Governo, criando o delta para o Oceano Atlântico, a cidade do Recife é famosa por suas pontes, pelas suas lendas urbanas, pela sua história de lutas libertárias, pelas inúmeras igrejas, pelos seus clubes carnavalescos, pelas lindas mulheres e belas praias.
É no Recife que em todo sábado de carnaval sai às ruas o maior bloco carnavalesco do mundo: o Galo da Madrugada. É no Recife que acontece a Noite dos Tambores Silenciosos, cerimônia de sincretismo religioso realizada em pleno carnaval do Recife, na noite de segunda-feira, no Pátio do Terço.
O natural da cidade possui natureza revolucionária. Briga pelos seus direitos e é dono de uma natureza crítica, e, ainda que sejam desconfiados, são amistosos com os forasteiros. O recifense tem orgulho de sua cidade, pois para ele é no Recife que existe o maior e o melhor sonho do mundo.
Já Olinda - denominada também de Marin dos Caetés - é Patrimônio Histórico da Humanidade, e completa neste 2019, na mesma data, 484 anos.
Olinda é uma cidade boêmia. O olindense é cool e odeia pretensão. Dona de um casario colorido, a cidade abriga artistas, como Alceu Valença e, no carnaval, bonecos gigantes saem às ruas homenageando as mais diversas personalidades brasileiras, seguidos por clubes como Elefante, Pitombeira dos Quatro Cantos e outros.
Recife e Olinda são duas cidades guerreiras. O seu povo valoriza suas conquistas, defende suas bandeiras ainda que ambas possuam as mais diversas cores e contrastes. O Humanitas deseja para essas duas cidades um feliz aniversário e que seus habitantes não abdiquem da luta contra a tirania, a opressão e a intolerância.

HUMANITAS Nº 81 - MARÇO DE 2019 - PÁGINA OITO

Mulheres continuam na luta por mais
empoderamento e igualdade de direitos
Especial do Humanitas
 
O Dia Internacional da Mulher, comemorado em 8 de março, é o resultado de uma série de fatos, lutas e reivindicações das mulheres por melhores condições de trabalho e direitos sociais e políticos.
Essa luta começou na segunda metade do Século XIX e continua permanente, neste Século XXI.
A História assinala que no dia 8 de março de 1857, trabalhadores de uma indústria têxtil de Nova Iorque fizerem greve por melhores condições de trabalho e igualdades de direitos trabalhistas para as mulheres. O movimento foi reprimido com violência pela polícia.
Indo mais perto do tempo, em 8 de março de 1908, trabalhadoras do comércio de agulhas de Nova Iorque, realizaram uma manifestação para lembrar o movimento de 1857, exigindo o voto feminino e fim do trabalho infantil. 
A polícia, seguindo ordens do patronato, também reprimiu violentamente a manifestação.
No dia 25 de março de 1911, mais de 145 trabalhadores - maioria dele mulheres - morreram queimados num incêndio ocorrido numa fábrica de tecidos em Nova Iorque.
As mortes ocorreram em função das precárias condições de segurança no local.
Como reação, o fato trágico provocou várias mudanças nas leis trabalhistas e de segurança de trabalho, gerando melhores condições para os trabalhadores norte-americanos.
No ano de 1910, durante uma conferência na Dinamarca, ficou decidido que o 8 de março passaria a ser o Dia Internacional da Mulher, em homenagem ao movimento pelos direitos das mulheres e como forma de obter apoio internacional para a luta em favor do direito de voto para as mulheres (sufrágio universal). 

CONQUISTAS INSTITUCIONALIZADAS


Em 1840, Lucrécia Mott lutou pela igualdade de direitos para mulheres e negros dos Estados Unidos.
Em 1859, surgiu na Rússia, na cidade de São Petersburgo, um movimento de luta pelos direitos das mulheres.
No ano de 1862, as mulheres puderam votar pela primeira vez na Suécia. Em 1865, na Alemanha, Louise Otto, criou a Associação Geral das Mulheres Alemãs.
Em 1866, no Reino Unido, o economista John S. Mill escreveu, exigindo o direito de voto para as mulheres inglesas.
No ano de 1869 foi criada nos Estados Unidos a Associação Nacional para o Sufrágio das Mulheres. Em 1870, na França, as mulheres passaram a ter acesso aos cursos de Medicina. 
Em 1874 foi criada, no Japão, a primeira escola normal para moças. 
Em 1878 foi criada na Rússia a Universidade Feminina. 
No ano de 1893, a Nova Zelândia tornou-se o primeiro país do mundo a conceder direito de voto às mulheres (sufrágio feminino). A conquista foi o resultado da luta de Kate Sheppard, líder do movimento pelo direito de voto das mulheres na Nova Zelândia.
Em1901, o deputado francês René Viviani defendeu o direito de voto das mulheres.
No ano de 1940, Hattie Mcdaniel foi a primeira atriz negra a ganhar uma estatueta do Oscar. O prêmio foi por sua ótima atuação como atriz coadjuvante no filme “E o vento levou ...". 
Em 1951, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estabeleceu princípios gerais, visando à igualdade de remuneração salarial entre homens e mulheres no exercício da mesma função.