EDITORIAL
Em defesa da
tolerância
O economista inglês John Stuart Mill disse em
sua obra Sobre a Liberdade, que a humanidade terá muito a ganhar deixando que cada um viva como lhe
parece bem, e não forçando cada um a viver como parece bem aos restantes.
Com isso ele quis
dizer que o ser humano é beneficiado em seus vários espaços comuns quando
permite o florescimento de vários estilos de vida e de ideias, pois estes
representam experiências com as quais muito se poderá aprender sobre como lidar
com a raça humana.
Na verdade, ninguém
tem o direito de dizer a outro como viver ou como agir, desde que esse viver e
esse agir não prejudiquem a terceiros.
Vale para todos os
alienados fundamentalistas religiosos e fascistas que pretendem impor à
sociedade um controle rígido sobre os pensamentos para salvar o homem de
demônios inexistentes.
Nasce assim a pergunta:
“o tolerante deve tolerar o
intolerante?”. A resposta é: NUNCA! Para sermos tolerantes
devemos proteger a tolerância de tal modo que todos possam expor um ponto de
vista, mas sem forçar os demais a aceitá-lo.
O raciocínio honesto e
a argumentação devem dar as caras na defesa da tolerância. Devem se tornar as
principais leis a seu favor. Sim, porque a tolerância é uma virtude rara e
importante. Já a intolerância é um fenômeno psicologicamente interessante
porque é sintomático da insegurança e do medo. O medo gera a intolerância e a
intolerância gera o medo: o ciclo é vicioso.
Neste início de ano
devemos entrar na luta pela tolerância visto que os intolerantes estão nas ruas
vestidos com as fardas do fascismo radical e do fundamentalismo evangélico,
buscando fazer com que vivamos e atuemos de acordo com o modo de pensar deles.
Devemos levar em
consideração a máxima de que é possível tolerar uma crença ou uma prática sem a
aceitar, pois o mundo é suficientemente vasto para permitir a coexistência de
várias alternativas.
O raciocínio imparcial
de um espírito informado favorecerá o bem e a verdade. Toleramos melhor os
outros quando sabemos como tolerar a nós mesmos; aprender a fazê-lo é o
objetivo da vida civilizada.
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O enigma da descrença – Morton Hunt (*)
Por que descrentes são diferentes da grande
maioria de seus semelhantes? Eles não são, entretanto, únicos, pois ao longo da
história civilizada uma pequena minoria não necessitou de explicações sobrenaturais
religiosas para seus próprios pensamentos ou para os mistérios, tragédias e
glórias do dia-a-dia da vida.
Não me refiro somente
aos ateus ferrenhos, mas àquela minoria maior que manteve ou mantém um conceito
deístico de Deus ou que considera as leis inerentemente consistentes da
natureza - que governam o comportamento de galáxias, genes e quarks - com a
reverência e o respeito que outros conferem a um deus mais tradicional.
O melhor exemplo de
tal pessoa de fato precede a ciência moderna. É Spinoza, para quem Deus era
co-término com o Universo, nem exterior nem acima, mas idêntico a ele e a todas
suas leis naturais.
Para ele, Deus não era
nada mais nada menos que o corpus
total dessas leis.
Talvez descrentes não
rejeitem as necessidades e impulsos religiosos da raça humana ao adaptá-los em
termos realísticos e humanísticos, trocando os contos de fada das religiões
convencionais por contos mais intelectuais, proporcionados pela ciência moderna
- leis naturais e evidências demonstráveis e reproduzíveis de relações de causa
e efeito.
Talvez os descrentes
satisfaçam a necessidade humana básica por ordem e integração social dentro da
sub-sociedade da própria ciência e sua estrutura hierárquica. Talvez para os descrentes
o humanismo científico ofereça respostas satisfatórias a todos os profundos e
problemáticos mistérios que a religião propõe-se a responder, e os descrentes
estão confortáveis com tais respostas. apesar de serem incompletas e apesar de
que, independentemente de quanto nosso conhecimento cresça, permanecerão assim,
com novas descobertas sempre levantando novas e mais complexas questões sobre a
realidade.
Finalmente, talvez os
descrentes divirjam da grande maioria de seres humanos de um outro modo; talvez
sejam psicologicamente adultos, não necessitando da invisível figura de um pai,
capazes de encarar a realidade da vida e morte humanas sem medo (ou ao menos de
conviver com tal medo) e sensatos demais para acreditar em qualquer coisa sem
comprovação, em qualquer explicação do mundo que seja impossível ou absurda.
Todavia, isso é
somente uma conjetura; talvez eu esteja lisonjeando os descrentes sem motivo;
talvez eles não sejam tão especiais e maravilhosos. Mas espero que sejam.
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