quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

HUMANITAS Nº 44 – FEVEREIRO DE 2016 – PÁGINA 6

ESCOLHA O SEU PRÓPRIO JESUS
Especial para o Humanitas
Texto extraído de  www.thomasdetoledo.blogspot.com.br

Thomas Henrique de Toledo Stella é professor e historiador pela FFLCH/USP. Mora em São Paulo/SP

Um dos assuntos mais chatos de se conversar é sobre Jesus. Afinal, há tantos tipos distintos descrevendo Jesus, que chego a uma simples conclusão: ele é o que cada um quer que seja.
Vejam alguns dos exemplos de descrições que ouvi sobre este famoso homem:
Para os cabalistas, Jesus é uma representação arquetípica da esfera de Tipharet.
Para os católicos, Jesus é o filho único de Deus e nós não somos nada. Para os judeus, Jesus foi um agitador e nem pode ser chamado de messias.
Para os muçulmanos, Jesus é um profeta, mas Mohammed é mais importante. Para os budistas, Jesus foi um homem que encontrou o Nirvana. Para os hindus, Jesus foi um avatar que saiu da roda de Samsara.
Para os tântricos, Jesus despertou a kundalini junto à flor de lótus de Madalena. Para os essênios, Jesus era um sábio professor. Para os espíritas, Jesus é reencarnação de um profeta do Antigo Testamento.
Para os esotéricos, Jesus era um místico que pregou o amor incondicional.
Para os esquisotéricos, Jesus encarnou em duas pessoas ao mesmo tempo. Para os evangélicos, Jesus é quem proíbe os gays de se casarem.
Para os gays, Jesus era suspeito por que só andava com homens e prostitutas.
Para os alcoólatras, importa saber que Jesus gostava de vinho. Para os maconheiros, Jesus era hippie cabeludo com um sudário de cânhamo.
Para os comunistas, Jesus era um líder revolucionário.
Para os capitalistas, Jesus é uma lucrativa mercadoria. Para os ufólogos, Jesus era um alienígena que não ressuscitou, mas foi abduzido.
Para os palestinos, Jesus era um militante anti-sionista. Para os rastafaris, Jesus era negão e tinha dreads. Para os alemães, Jesus era loiro e de olhos azuis.
Para os cariocas, Jesus está de frente para os condomínios ricos e de costas para as favelas.
Também escolhi a minha própria visão: a de um historiador.
Jesus, assim como muitos outros, em tantas sociedades e períodos históricos foi um homem à frente de seu tempo.
Morreu condenado como todos que propuseram algo radicalmente novo e seu sofrimento não foi diferente de vários rebeldes que existiram na História.
Jesus jamais propôs criar uma religião e provavelmente teria caído no esquecimento se não fosse um homem chamado Paulo ter criado uma doutrina, uma igreja católica ter criado um dogma e um império romano tê-lo transformado em líder religioso.
Assim surge uma divindade chamada Cristo, muito diferente do homem Jesus, que incorporou histórias de outros Deuses, semideuses e heróis.
Jesus Cristo tornou-se, portanto, uma marca, um logotipo que justificou massacres, guerras, colonialismos, assassinatos e crimes. Instituições beneficiaram-se de seu mito e tornaram-se poderosas: impérios, igrejas, comerciantes, organizações.
Seu espectro tornou-se uma das mais valiosas mercadorias para os que se nutrem da indústria da fé. Assim Jesus Cristo tornou-se o oposto do jovem mortal Yeheshua (Jesus em aramaico), que se metamorfoseou em milhares e milhares de histórias, algumas hilárias e folclóricas, outras abstrusas.

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