As obras de deus
Jorge Oliveira de Almeida - Rio de Janeiro/RJ
Deus
descansou, descansou e descansou. Claro, estava no seu direito. Ele, que tudo
sabe e tudo vê, e que não tinha que dar satisfações a ninguém porque era único,
assim ficou: paradão a eternidade inteira, até o dia em que de saco cheio por
não fazer nada resolveu criar alguma coisa para se divertir.
Começou por
criar o planeta Terra. Bastou um estalar de dedos e zás! A Terra foi criada. A
seguir criou o resto do Universo, mas teve o grande cuidado de situar a Terra
não só no centro do sistema solar, mas também no centro do Universo. Claro que
ele podia fazer como bem quisesse, mas considerando que deveria fazer o melhor
possível, assim o fez.
Muito tempo
depois apareceram uns caras querendo contestar suas obras. Onde já se viu
tamanho desplante? Deus então viu-se na obrigação de dar-lhes uma mostra de seu
poder e imediatamente determinou que seus asseclas mandassem-nos todos para a
fogueira.
Foi uma
poluição geral! Todo dia havia churrasquinho de gente, com aquele cheirinho
característico de carne assada. E a fumaça? Naquela época, aqueles que ainda
conseguiam permanecer vivos, deviam ter muita dificuldade para dormir, devido à
quantidade de fumaça no ambiente!
Voltando
para onde estávamos, o Homem ainda não havia sido criado e era preciso fazê-lo!
Nada mais simples para quem não precisava deparar-se com dificuldades que
seriam comuns a qualquer mortal para fazer o que quisesse. Então
juntou um pouquinho de barro e zapt! Eis o Homem criado!
Entretanto, seria necessário criar também a mulher,
porque Deus estava ciente que sozinho não poderia criar tantos bonequinhos para
diverti-lo. Já imaginaram, cada vez que ele julgasse necessário criar mais um
habitante, ele é que teria que fazê-lo? Não haveria tanto espermatozóide divino
assim disponível (ou melhor, tanto barro!).
Então, com
sua sábia justeza e sabedoria, tirou uma costela do Adão (aquele homem que ele
criou) e, num passe de mágica, criou também a mulher! Agora poderia descansar
satisfeito.
Os homens e
as mulheres foram ao longo dos tempos fazendo aquilo que fazem todos os
animais, até que um dia ele se questionou: por que não ter um filho, não feito
de barro, mas de minha própria carne e à minha imagem e semelhança?
Não deveria
ser tão difícil. Bastaria agitar a sua varinha de condão. Mas ele quis ser mais
sofisticado. Assim, resolveu deixar a sua marca registrada. Sabedor da vida de
todos os seres da Terra determinou que Maria, uma pobre trabalhadora rural,
analfabeta, que vivia lá no Oriente Médio com os seus boizinhos, com os seus
cabritinhos e com os seus burrinhos (e havia muitos!) e que era casada com um
cara que não gostava muito da fruta,
seria a escolhida para aquela relação inusitada entre um ser humano e uma
divindade. Mas se ela nunca havia comido um peru (porque só havia as festas
saturninas e ainda não existia o Natal), como cativá-la para prová-lo? Na mente
divina tudo é fácil de resolver: se travestiu o Divino na forma de um pombo (e olha que era um baita pombo!) para
seduzir a jovem moçoila.
Assim como
quem dá um tiro dá dois e três, certamente o tal pombo deve lá ter voltado
muitas outras vezes à casa da Maria, agora que a porteira estava aberta! O
disse-me-disse levou os vizinhos do Zé (esse era o nome do chifrudo) a
agredi-lo com insinuações e palavras maldosas, mas ele não se sentia
prejudicado porque já fora avisado por asseclas do pombo-correio que a sua
mulher (aquela que ele não queria comer) teria um filho divino! Até ficava
orgulhoso disso.
Todos riam
dessa situação, mas ele, como corno manso, não se preocupava com os
mal-dizeres. Como não poderia deixar de acontecer, um dia nasceu o fruto
daquela união: Jesus Cristinho veio ao mundo!
Acontece que
a partir daí aqueles que caçoavam passaram a ficar em dúvida quanto à não
santidade do cara, pois nunca se vira até então tantos milagres acontecerem!
Era um atrás do outro! Todos aqueles truques que os mágicos fazem hoje ele já
os fazia desde pequenino: transformar água em vinho, multiplicar os pães...
Chegou até a
ressuscitar os mortos. Naturalmente aqueles que lhe convinham.
O tempo
passou e os milagres foram rareando. Mas, pudera! Deus resolvera descansar e
assim deu uma banana para todos os que se multiplicaram na Terra. Foi-se o
tempo dos festivais de milagres.
Agora é
preciso trabalhar, suar e estudar bastante para ser alguma coisa na vida. Agora
a Humanidade deixou de ser um objeto de lazer e de prazer para o Divino e os seres humanos passaram a
lutar pelas suas vidas. Não estão mais esperando que os pães se multipliquem.
Eles mesmos fabricam os seus pães!
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