segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

HUMANITAS Nº 56 – FEVEREIRO DE 2017 – PÁGINA 5

Cinema e História
Especial para o Humanitas

Araken Vaz Galvão é escritor e membro da Academia de Artes do Recôncavo. Mora em Valença/BA

Por volta de 1967, quiçá 68, assisti, em Montevidéu, dois filmes da então república da Tchecoslováquia, um deles, cujo título era “Una Bomba para el Verdugo”, tratava da reconstrução do atentado perpetrado contra Reinhard Heydrich, o “protetor” do Reich para a Boêmia e a Morávia.
Esse filme, como vários outros daquela antiga república comunista, era de qualidade inconteste. Reinhard Heydrich (1904-1942), dirigente nazista e militar alemão, chefe da polícia nazista, famoso pela crueldade, amigo íntimo de Hitler, foi nomeado por este governador da Morávia e da Boêmia (Tchecoslováquia).
Lembrava-me particularmente daqueles dois filmes e sempre que conversava com dois amigos amantes do bom cinema como eu, os doutores Démorse e Marcos, falava deles e me lamentava não saber informar seus títulos no Brasil.
Mais tarde, vim a saber que um tivera título similar ao que vi no Uruguai: “Trens Estreitamente Vigiados”.
Já o outro, por ter perdido grande parte dos meus apontamentos, porque fiquei muitos anos exilado, demorei anos para conseguir saber qual o título que tivera entre nós.
Aliás, nunca soube nem saberei, pela simples razão de que esse filme não foi lançado no Brasil. Entretanto, graças a uma amiga uruguaia, Adriana, consegui matar a charada.
Aquele filme, teve como diretor Jiri Sequens, e o título original em tcheco era Atentát (O Atentado) e fora feito no ano de 1964. Este diretor não consta no dicionário de cineastas que possuo.
Lembro-me que havia uma relação com o nome Reinhard Heydrich, ou com uma alcunha carinhosa que os nazistas lhe deram, que significava “anjinho”. Logo a ele que era um sanguinário verdugo e que foi apelidado de “o carniceiro de Praga”. Heydrich, ao ser assassinado pela resistência tcheca – se bem que assassínio aí é um eufemismo, pois o nome que se aplica nesses casos (os de matar um opressor estrangeiro) é justiçamento – provocou um dos maiores massacres da história da humanidade: a aldeia tcheca na Boêmia Central, Lídice, próxima de Praga, foi arrasada pelos nazistas, por ordem pessoal de Hitler, em represália. Por esse motivo ela foi transformada em monumento mundial contra o genocídio.
Em todo o mundo Lídice passou a representar esse símbolo, da mesma forma que existem cidades e vilas no Brasil (e em todo o mundo) com este nome. Até como nome de pessoas existe. Em Salvador/BA tivemos uma prefeita com o prenome de Lídice.
Sobre o atentado em si, alguns historiadores dizem que ele foi completamente inócuo, e que se tratou apenas de mais uma perfídia da “Pérfida Albion”, com o fito de desarticular a eficiente resistência tcheca, da qual a Inglaterra não tinha controle, pois agia sob o comando do partido comunista. Há também a comprovação (ou especulação) histórica de que enquanto os patriotas tchecos eram massacrados, o capital inglês se locupletava com a “secreta” participação nas importantes indústrias, inclusive de armamento daquele país.
O atentado – de grande repercussão política e de grande impacto propagandista para os Aliados foi organizado em Londres, pelo serviço secreto britânico, o qual treinou os partisans tchecos e os lançou de pára-quedas em território inimigo - Partisan, maqui, são nomes que, na Europa, significam guerrilheiro.
No meu tempo chamávamos de “combatente revolucionário”. Eu, ainda que de forma muito modesta, fui um deles.
O grupo, uns cinco ou seis, contou com o apoio da resistência tcheca, e depois do atentado e da localização do grupo vindo da Inglaterra, no porão de uma igreja, aqueles heróis não se renderam, resistiram até o fim, reservando a última bala para se matarem.
É preciso que se diga, no entanto, que o sacrifício de Lídice deu-se como represália, antes mesmo de terem identificado os autores do atentado. Dizem alguns historiadores de hoje que, com isso, os ingleses marcaram um grande tento de propaganda e, ademais, diminuía a influência dos comunistas, já que os seus melhores quadros teriam sido (e foram realmente) sacrificados.
Mas a guerra ainda durou alguns anos, a Tchecoslováquia foi ocupada por tropas soviéticas, o stalinismo foi instalado, muita água passou sob a ponte – como se diz – o Muro de Berlim caiu e hoje aquele país foi dividido em duas repúblicas, a Tcheca e a Eslováquia, dentro da melhor prática do princípio romano: dividir para dominar.
Mas isso já é outra história e não tem mais nada a ver com cinema...

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