A ordem sequencial das tragédias
Especial para o Humanitas
Ana Maria Leandro - uma das principais
colaboradoras do Humanitas - é
escritora e jornalista. Atua em Belo Horizonte/MG
Sobre os
horrores acontecidos no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaq), em
Manaus, as “autoridades”
conseguiram definir rapidamente a causa, para resposta à sociedade: “a revolta foi motivada por briga entre
facções”.
Pronto, pivô
detectado, a responsabilidade é dos prisioneiros mesmo, (que, aliás, são mesmo
um problema para a nação) e podemos ir deitar sossegados que não temos culpa
nenhuma!
É
impressionante como as instituições governamentais (algumas vezes também
privadas e “propinadas”),
insistem em achar “causas” das
quais não precisem assumir culpas, pois isso sim, é o que é preocupante...
Esse
processo me faz lembrar a frase: “fuja
de seus erros e não se livrará deles...”
Há pouco
tempo, na tragédia da queda do avião do time de futebol do Chapecoence,
atribuíram a culpa à moça que “bate
carimbo” de aprovação do vôo.
Se lhe fosse
outorgado o poder de dizer “não
baterei o carimbo, pois há problemas neste plano de vôo” o carimbo não
bateria sozinho. Mas este problema não é analisado.
Considerar
que a “causa verdadeira”
antecede ao ato e que tem fundamentos muito mais longilíneos e exigentes de
providências, é difícil e desestabiliza o “status
quo”. Dá trabalho, gasta-se dinheiro e nada sobra para se fazer
corrupção.
E assim
vamos neste pobre país (pobreza de alicerces é a pior pobreza), apontando as
falhas de ponta, e manipulando o esclarecimento das de fundamento.
Quem não
sabe que a superlotação de presos nos presídios públicos (e já alguns privados)
é absurda, e significa um fantástico caminho para a união e consequente estouro
de tragédias promovidas pela marginalidade?! Briga de facções!? Mas como? Havia
facções rivais juntas? Isto é jogar combustível no fogo!
Já se sabe
que ao fato antecedeu-se barulhenta festa e música alucinante. Naturalmente que
não era uma festa regada a água e refrigerante! E os “ingredientes” (melhor nem citar a diversificação do
cardápio) da festança? Como entraram? Será que acharam alguma “moça do carimbo” que autorizou?
Aliás, essas
pobres moças são “grandes autoridades”
quando os problemas acontecem. Quando não há problemas são apenas “carimbadoras” mesmo... E
naturalmente dirão que o que vou citar a seguir tem origens na formação também
pedagógica que possuo.
Mas se
traçarmos uma linha entre o que se aplica em educação e sistema carcerário
veremos um grande equilíbrio.
As escolas
públicas também têm salas superlotadas para professores mal pagos. Nos sertões
do país então nem se fala nas condições das salas de aula. E mais: assassinatos
já aconteceram até em salas de aulas de grandes centros urbanos.
Por outro
lado, o sistema carcerário trabalha com seguranças de celas superlotadas,
também com salários mínimos; e o agravante até de provocar os problemas de
concessões ilegais para presos, em troca de ganhos adicionais.
Na Educação
o governo vem com a eterna solução de superfície: “vamos mudar o sistema educacional. Tiramos disciplinas, colocamos
outras mais atraentes (vão ficar mais atraentes só se forem aplicadas
por extraterrestres, pois os professores aqui da Terra, nem ao menos recebem
treinamentos para essas mudanças); convencemos
os alunos que eles é que terão o livre arbítrio de escolher o que querem
(o marketing é sensacional!) e
assim acabamos com a invasão de escolas por alunos descontentes.
Melhorias de condições salariais para o professor (psiiiuu... silêncio).
E pelo que
está sendo analisado nas reformas da Previdência, corre-se o risco de um
professor ter de trabalhar além dos setenta anos, lidando com crianças e
adolescentes!
Lançam
pretensas “inovações” como se
estivessem descobrindo a roda.
Qualquer
pessoa em torno de sessenta anos, recebeu na antiga escola secundária
orientações vocacionais, como parte do programa em atividades aplicadas:
marcenaria; economia doméstica; etc.
Quem nesta
faixa etária não se lembra das antigas “oficinas”,
para que o aluno pudesse receber orientações de atividades práticas, que lhes
servissem de base para futuras escolhas profissionais?
Com o tempo,
foram tirando este programa aplicativo e caiu-se no programa comum para o
Ensino básico (que inclui da 1ª à 8ª série).
Agora,
lançam a proposta como se fosse inédita!
Está bem,
retomar caminhos que se demora a descobrir que eram melhores é saudável. Mas
não me venham com bordões de “Inovação
no Ensino”.
Por
favor, entendam de uma vez, que a evolução da vida é sequencial, e que o que
deixamos de fazer de necessário no hoje, fará falta amanhã...
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