O
que é a semana santa?
Texto de Ivani
Medina, artista plástico e pesquisador autodidata. Mora no Rio de Janeiro/RJ
Oficialmente,
a semana santa é a celebração da paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo.
Mas qual seria a explicação para sua origem real e motivacional? A semana santa
funciona como um abanador que mantém vivo o fogo das brasas da crença cristã.
Crenças não dialogam com a razão. Estão
voltadas diretamente ao emocional, para as necessidades inconscientes do
indivíduo, para a qual outro tipo de linguagem há de ser dirigida. Para tanto,
é preciso que a paixão de Cristo arda como uma fogueira. No crepitar dos
sentimentos fortes, sob o calor intenso de planejada emoção, os olhos
instintivamente se fecham à realidade.
Por um período mais longo do que as
comemorações religiosas que pontuam o ano inteiro, a dura realidade da vida
pessoal vai para segundo plano e dá lugar a um intenso sentimento coletivo que
mistura uma dor maior (a dor do deus salvador), gratidão (pela salvação dos
pecados) e esperança (numa feliz vida eterna). Daí a importância de se reviver
a “história sagrada” em meio à
multidão. Evidentemente, não foi o cristianismo que inventou essa técnica para
a perpetuação da sua crença. Inventou outra coisa. O fato é que isso existe
desde muito antes da propagação do monoteísmo judaico.
Sempre que recuamos no tempo na observação
desse assunto, nos deparamos com outra história mais cabeluda ainda.
Uma história de poucas abstrações, sem
apelo a espiritualidade, na qual, como no jogo do bicho: “vale o que está escrito”.
O acadêmico judeu e teólogo, Richard Elliot
Friedman, titular de hebraico e literatura comparada, ocupante da Katzin Chair
na Universidade da Califórnia, diz:
“Deus
desaparece na Bíblia. Leitores religiosos e não-religiosos por certo irão achar
tal afirmação surpreendente e intrigante, cada qual por suas próprias razões.
Confesso, de minha parte, que a acho estarrecedora. A Bíblia se inicia, como
todo mundo sabe, num mundo em que Deus está ativamente e visívelmente
envolvido, mas não é assim que termina”. (FRIEDMAN,
1977, p. 19, O Desaparecimento de Deus: um
mistério divino, Imago Editora,
Rio de Janeiro, 1997.)
Durante a Idade
Média, para proteger o judeu medievo do assédio cristão, um filósofo judeu,
chamado Moisés de Leon, no século XIII, desenvolveu um novo guia de
interpretação da Torah, mais abstrato, místico ou espiritual e muitíssimo
inteligente - o Zohar. Atualmente, o judaísmo se entende assim, distanciado da
antiga realidade literal mesopotâmica.
Claro que os
judeus ortodoxos não aceitam a existência desse momento de transformação, pois
para eles, segundo a tradição, o primeiro cabalista foi Abraão e tudo sempre
foi assim, como é entendido hoje.
É bom registrar
também que essa onda de “espiritualidade”,
igualmente envolveu outras crenças religiosas no período medieval, e não
somente o judaísmo.
Segundo um dos
mais conhecidos estudiosos de religião, Mircea Eliade em O Sagrado e o
Profano; tradução Rogério Fernandes - São Paulo: Martins Fontes, 1992
(Versão digital), “Participar religiosamente de uma festa implica a saída da
duração temporal “ordinária” e a reintegração no Tempo mítico. Por
consequência, o Tempo sagrado é indefinidamente recuperável, indefinidamente
repetível. De certo ponto de vista, poder-se-ia dizer que o Tempo sagrado não
“flui”, não constitui uma “duração” irreversível (qual o tempo histórico)”.
(ELIADE, 1992, p. 38)
Cristo estaria
bem mais seguro no tempo mítico. Como bem disse Tom Harpur em O Cristo
dos Pagãos: a sabedoria antiga e o significado espiritual da Biblia e da história
de Jesus. São Paulo - Pensamento, 2008.
"O mito é
um meio de expressar a estrutura essencial ou o significado oculto de toda
história. Analisando os mitos gregos mais conhecidos, por exemplo, você verá
que cada um carrega em si uma verdade profunda da condição humana que continua
eterna muito embora o acontecimento nunca tenha se realizado." (HARPUR, 2008).
O cristianismo
mais parece um antídoto religioso, cuja criação se deve à crescente propagação
do judaísmo nos primeiros séculos. Setores influentes da sociedade greco-romana
não aceitavam isso.
A Semana Santa
revive na ficção um drama nada parecido com esse que muito se conhece. Este é
assunto proibido que não aparece nas escrituras. Se pesquisar religião fosse
estudar as escrituras, discorrer sobre a vida do Walt Disney seria versar-se no
Pato Donald.
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