sexta-feira, 30 de junho de 2017

HUMANITAS Nº 61 – JULHO DE 2017 – PÁGINA QUATRO



O MITO DE ARIADNE

Artigo completo em www.arakenvaz.blogspot.com.br
Araken Vaz Galvão é escritor e membro da Academia de Artes do Recôncavo. Mora em Valença/BA

Sei que o conceito de mito, mesmo sendo muito elástico, é do conhecimento geral. E, embora, um dos papéis do jornalista seja o de educar, além de bem informar, longe deste cronista desejar pousar de professor para os leitores do jornal, pois sou apenas, como disse o compositor popular, um eterno aprendiz”.
No entanto é mister falar que os mitos são elementos subjetivos básicos na formação de quaisquer sociedades. Alguns são belos, frutos da instigante imaginação de muitas gerações; outros são a consequência da superstição e até da pouca escolaridade. (...)
Agora, depois de ter falado de mitos nascidos da ignorância, vamos a outro, nascido de uma bela imaginação. O Mito de Ariadne
Este instigante mito interessa-me sobremodo, particularmente agora, devido ao fio – poderia mesmo dizer que “o liga a uma situação peculiar, senão única” –, uma vez que estamos sempre ligados, desde o cordão umbilical, a algo. Há sempre um fio que nos liga a alguém ou a alguma coisa.
Embora existam várias versões, algumas com desfechos diferentes, não raros com detalhes contraditórios, o fundamental do Mito de Ariadne” (Ariane ou Ariadna, segundo algumas grafias), diz que ela era filha de Minos, rei de Creta.
Ela teria se apaixonado por Teseu, cujo nome significa “homem forte por excelência” – que foi um herói proto-histórico, já que não existem provas que ele teria realmente existido, ainda que alguns historiadores opinem que ele teria governado Atenas, entre 1234 a 1204 a C. –, segundo se vê na Wikipédia. (Internet).
Seria longo reproduzir aqui as peripécias vividas por Teseu, basta-nos, porém, saber que ele seguiu para Creta, disposto a entrar no labirinto onde vivia o Minotauro e matá-lo.
Tendo tido sucesso nesta empreitada devido à ajuda de Ariadne, a qual encontrou uma solução simples para que ele saísse do Labirinto – uma vez que era notório que se entrando lá, nunca se saía –, exigindo apenas, para ajudá-lo que ele se casasse com ela.
A solução consistiu em dar a Teseu um novelo de lã (o fio de Ariadne, até hoje falado, ainda que pouco conhecido em pormenores).
Ele iria desenrolando ao entrar, bastando acompanhar o fio ao voltar, onde ela se encontrava pronta para exigir o pagamento pelo serviço prestado.
Sabendo que irá, uma vez por ele desposada, prestar outros serviços bem mais interessantes e saborosos.  
Ao escrever, usando uma forma até de certa forma jocosa, sobre Ariadne esperando Teseu sair do labirinto, lembro-me de um texto de um escritor espanhol Jorge Semprun (1923-2011), sobre uma situação similar, só que vista do ponto de vista masculino: “Dezessete anos antes, em Roma, ele atravessara o espaço que o separava de Franca. Mas é sempre a mesma coisa. Atravessa-se sempre um espaço: uma rua, um salão, uma galeria de arte, uma floresta, o oceano: a vida, para ir em direção às mulheres. Caminha-se sempre do mesmo modo, com uma idêntica esperança, uma perturbação idêntica: a mesma.”  
Teseu entrou no Labirinto, matou o Minotauro, voltou seguindo o fio, e partiu levando Ariadne.
Poder-se-ia agora dizer, usando do verso da música popular – e voltando, não seguindo o fio de Ariadne, mas a pisar o chão firme da nossa terra, e da nossa narrativa hoje em dia –, que a notícia carece de exatidão.
Não pelas razões contidas na letra da referida música, mas por existir – como já foi dito acima – várias versões sobre o que ocorreu na continuação.
Mas essas versões, para nós, neste momento, carecem de utilidade, porque o que nos interessa é a simbologia contida na alusão ao fio.
Embora já tenha feito alusão ao cordão umbilical – este fio que, ao nos ter protegido e ligado à vida enclausurada do ventre materno, ao ser cortado, ligar-nos-á para sempre a uma família, a qual passará a ser, de forma inexorável, o elo que nos mantém preso a outra forma de vida –, por isso sou tentado a fazer agora uma analogia com outro importante mito grego, no caso o de Odisseu.
Melhor, o de Penélope, posto que esta, esperando a volta do marido, não se sabe por ter apenas esperança de que ele não estivesse morto ou tão-somente o desejo de que ele surgisse assim, do nada, tece uma manta durante o dia, e à noite ela desmancha todo o trabalho realizado.
Até parecia que, sentada em sua casa, tecendo durante o dia, mas desfazendo, durante a noite, o trabalho realizado, no simples gesto de puxar o fio, para desmanchar a urdidura que, uma vez concluída, a uniria fatalmente a outro homem.
Simbolicamente, seria como se Penélope estivesse, não apenas ganhando tempo, como se diz popularmente, para não ter que optar por nenhum dos pretendentes, mas puxando de volta, por aquele tênue fio, o seu marido de volta. Ou seja, fazendo o tempo correr até que ele voltasse.

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