segunda-feira, 2 de outubro de 2017

HUMANITAS Nº 64 – OUTUBRO DE 2017 – PÁGINA 8



O artista que viu o mundo começando no Recife

Cícero Dias, artista plástico pernambucano conhecido internacionalmente, combinava as mais autênticas tradições pernambucanas com a essência universal da arte.
Nasceu no Engenho Jundiá, município de Escada, a 50 quilômetros do Recife/PE, em 5 de março de 1907, mudando-se em 1925 para o Rio de Janeiro, onde estudou na Escola Nacional de Belas Artes (ENBA).
A sua primeira exposição ocorreu em 1928. Naquela época, havia grande desconfiança em torno do tipo de pintura que ele fazia e quase nenhuma galeria carioca tinha interesse pela arte moderna.
Em 1931, no Salão Revolucionário, na Escola Nacional de Belas Artes (ENBA), expõe o seu polêmico painel, tanto por sua dimensão quanto pela temática, “Eu Vi o Mundo... Ele Começava no Recife”. Esse painel causa impacto pelo porte e pela concepção, impregnada de forças misteriosas do inconsciente e é a obra mais destacada do artista, antes de sua viagem para a França.
Em 1937, Cícero Dias foi morar em Paris, aconselhado pelo pintor Di Cavalcanti, e nesse lugar recebeu forte influência do meio artístico europeu. Paris na época era considerada como a capital cultural do mundo. Nessa cidade ele conhece e faz amizades com Georges Braque, Henri Matisse, Fernand Léger e Pablo Picasso.
Em 1942, é preso pelos nazistas e enviado a Baden-Baden, na Alemanha. Entre 1943 e 1945, vive em Lisboa como Adido Cultural da Embaixada do Brasil.
Uma das importantes fases da pintura de Cícero Dias é cheia de temas nordestinos, pintados nas suas frequentes viagens ao Recife, e evoca lembranças de sua infância na capital pernambucana.
Em sua autobiografia intitulada “Eu vi o mundo”, lançada pela Cosac Naify, em 2011, Cícero disse que “o que vivia dentro de mim era o sonho. Contradições que a natureza criava: o invisível e o visível”.
Na década de 1940 produz obras que apresentam um diálogo entre o figurativo e a abstração. Apesar do geometrismo, aparecem a vegetação, o canavial e o mar, como em Mormaço (1941) ou Praia, (1944). Retorna à França em 1945 e integra o grupo abstrato Espace, da Escola de Paris, até 1950.
 Pinta, em 1948, os primeiros murais abstratos da América Latina, para o Conselho Econômico do Estado de Pernambuco, atual Secretaria da Fazenda, no Recife. Neles, aproveita, como sempre, elementos da paisagem do Nordeste: canavial, jangadas, o vermelho dos telhados, mas submetendo-os a um processo do qual resultam formas simples e ricas de sugestões poéticas.
Cícero Dias morreu, em Paris, no dia 28 de janeiro de 2003.
(Texto de Rafael Rocha)

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