segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

HUMANITAS Nº 30 – DEZEMBRO DE 2014 – PÁGINA 8

O DIREITO À VIDA E À MORTE É SOMENTE DO ESTADO
Antônio Carlos Gomes – Guarujá/SP

No Brasil, bem como em Portugal a eutanásia é proibida. Eutanásia seria a possibilidade de abreviar o sofrimento de uma pessoa portadora de uma doença incurável, sujeita a intenso sofrimento.
Embora em algumas nações da Europa já esteja regulamentada a morte assistida, no Brasil e em Portugal, não se permite abreviar a dor incurável, mesmo em doentes em coma profundo sem chances medicas de retorno à vida.
O poder de decisão da vida nesses casos, no Brasil e em alguns países, é do Estado. Além da discussão filosófica sobre vida e morte, fator que direciona a lei, temos que considerar a tradição ocidental.
Considerando o livro Bíblia como a tradição oral mais antiga que dispomos, vemos que Moisés ao descer do monte com as Tábuas das Leis encontrou seu povo adorando o Bezerro de Ouro, portanto, rejeitando seu deus.
Num acesso de fúria ou de liderança, quebrou as tábuas de pedra e matou três mil homens de seu grupo como exemplo para os demais.
Fez novas tábuas e tanto nas destruídas como nas novas havia o mandamento que dizia: NÃO MATARÁS. Uma demonstração clara que a vida e a morte estavam com o líder e não era atributo individual.
Na história das cidades-estados gregas o trabalho era realizado por escravos e as guerras tinham como objetivo conseguir trabalhadores que seriam escravizados, além dos saques e estupros.
Esses indivíduos escravos passaram a ser propriedade dos cidadãos gregos, o que persistiu em todas as mudanças de domínio imperial: do Império de Alexandre até Roma.
Logicamente o escravo era um bem valioso por ter sido conseguido em luta de vida e morte.
Ele produzia a riqueza do Estado e reproduzia, gerando mais lucro com seus filhos.
É claro que não poderiam ter autonomia da própria vida.
A filosofia de Hegel que inclui a dialética Senhor Escravo e os estudos de Marx, sempre baseados em História, que era sua formação, ajudam a concluir que “o homem é também mercadoria”. Atualmente, a propriedade da vida foi devolvida ao sujeito em algumas nações, de modo completo ou parcial (o aborto também cabe neste raciocínio).
Em nosso país, a medicina encontrou como saída a especialidade Cuidados Paliativos, onde o doente em coma ou grande sofrimento será amparado de maneira digna até a morte natural, não incluindo desligar os aparelhos que prolongam a vida por muito tempo.
Não é o ideal, mas é melhor que a solução anterior onde o doente ou ficava em um quarto adaptado, sob a guarda da família, sem ninguém saber como proceder com toda parafernália de aparelhos; ou era transferido para uma clínica de doentes terminais, onde ficava sem nenhum contato afetivo até que a morte vencesse as máquinas.
A jurisprudência moderna diz que a eutanásia tem caráter criminoso, ao violar a proteção irrecusável da vida. Assim, viver é o bem mais valioso, inalienável e intransferível, primeiro direito da pessoa humana, que se deve proteger acima de todos os demais.
Tudo isso fica sob a tutela do Estado contra a vontade e os direitos do indivíduo. Portanto, é um direito humano indisponível.
Resumindo, quando se toma a vida como bem supremo não só é proibida a eutanásia, mas também impede que o doente terminal ponha termo a sofrimentos insuportáveis.
Isso faz com que o doente ganhe sofrimentos ainda maiores causados pelos tratamentos fúteis e pela obstinação terapêutica. 
O maior paradoxo é que quando a sociedade através da tutela estatal defende o "valor sagrado da vida" não impede e muito menos evita que ocorram guerras de extermínio, matanças religiosas e a pena de morte em alguns países.

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