terça-feira, 25 de agosto de 2015

HUMANITAS Nº 39 – EDIÇÃO DE SETEMBRO DE 2015 – PÁGINA 7

Consumismo desenfreado
Especial para o Humanitas
Antonio Carlos Gomes é um dos mais ativos colaboradores do Humanitas. É médico e mora em
Guarujá/SP

Oito bilhões de elefantes comendo a copa das árvores conseguem acabar com as florestas. Isto é o que está acontecendo. O consumismo desenfreado está acabando com o planeta. Esta foi à conclusão que me ocorreu quando, numa página de poesia, abriu-se um desafio de se escrever como proteger a natureza no dia do meio ambiente.
Não sou economista nem monge; tampouco prego vegetarianismo ou outra qualquer filosofia de vida ou modismos. Acompanhem meu raciocínio: excetuando-se dois bilhões de humanos que vivem em miséria absoluta, com centenas de mortes infantis por fome por dia, o restante da população tem algum consumo, variando conforme a classe social que ela se encontra. Usarei como parâmetro o Estado de São Paulo.
Nesta camada de consumo a grande parte consome mais do que precisa. Todos justificam com propriedade que é para seu bem estar e para não ficar inferiorizado perante seus vizinhos.
A partir de certo nível de ganho temos repetições de objetos:: um celular com máquina fotográfica que se conecta com a internet, uma máquina fotográfica, um tablete, um notebook, um computador. Portanto, repetições, o celular e o computador seriam suficientes para suas necessidades. Se tiverem uma boa televisão e no hipermercado aparecer uma oferta a preço tentador, comprarão outro aparelho para colocar no quarto.
Em seus armários encontraremos meia dúzia de toalhas de banho compradas em ofertas irresistíveis.
Mais: vários pares de sapatos, muitas calças, camisas, vestidos, blusas e assim por diante. Olhando bem, consumimos várias vezes mais do que a necessidade básica de viver bem.
O carro, se possível deve ser trocado cada um ou dois anos, cada eletrodoméstico é trocado regularmente em períodos breves, bem como os móveis, sempre que for possível, acompanhando a moda da época.
Toda novidade em eletrodomésticos, modas ou lazer é rapidamente adquirida. Se demorar muito para ter o dinheiro para a compra, a angústia acompanha a família.
O que tem a ver tudo isto com a natureza? Respondo: tudo!
O mundo atual é dominado por grandes conglomerados incluindo superempresas e bancos.
A mobilidade dos pequenos é limitada pelo capital que não possuem e dependem diretamente do sistema bancário e dos fornecedores, direta ou indiretamente ligados a uma empresa multinacional.
A lavoura e o agronegócio, por maior que seja, depende de fertilizantes, sementes e agrotóxicos, tudo dominado pelo capital internacional incidindo royalty e outras taxas.
Resumindo, o capital internacional dirige tudo, direta ou indiretamente e os bancos são os fornecedores do combustível para a economia funcionar.
Portanto, temos um sistema internacional (bancos e multinacionais) donos do capital, um sistema de distribuição (intermediários locais), um sistema de propaganda (imprensa) e consumidores. A imprensa é dependente e só sobrevive pelo capital.
Como tudo que se compra e produz é despesa em moedas estrangeiras, atinge a balança comercial e incide juros para o país.
O que se produz é em grande parte consumido no mercado interno, sem abater os dólares de custo (insumos, royalty, patentes, matérias primas).
O sistema fica sempre deficitário obrigando ao governo estimular a produção tanto para diminuir o déficit, como para amenizar a pressão que sofre como devedor. O sistema funciona para o país como um cartão de crédito que não se consegue pagar a totalidade da fatura e a divida sempre aumenta, no nosso caso obrigando a aumentar a produção.
A máquina do capital tende sempre a aumentar o lucro e maquia as bugigangas que oferece à população, para que esta gaste mais e gere maior receita.
Para aumentar a produção há necessidade de além de melhor técnica (sempre importada) mais terra (tanto para plantio, como geração de energia, transporte e armazenagem), obrigando a cada vez mais ocupar terras ocupadas por matas para produzir.
Os índios, sem terras e quilombolas deveriam ser respeitados nesse processo. Os primeiros preservando suas terras sagradas e de subsistência; os outros dois dentro de um processo de agricultura familiar, fornecendo alimentos para a população a um custo menor. Este procedimento não agrada ao capital, que além de necessitar do espaço para consumir insumos, teria a concorrência de produtos fora das bolsas de mercadorias; portanto sem lucro.
Nesses casos age com a imprensa, desqualificando este segmento e por via judicial, que sempre é oriunda da classe dominante, inclinada por convicção a concordar com o sistema de capital.
O sistema é fechado, portanto. As árvores continuarão sendo destruídas e os mais fracos expulsos de suas terras. Não vejo como reverter a situação enquanto durar esta forma de capital. A única maneira de controle é nossa própria restrição de consumo para poder quitar este cartão de crédito interminável.
A solução cabe a cada um dos cidadãos.

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