quarta-feira, 1 de novembro de 2017

HUMANITAS EDIÇÃO Nº 65 – NOVEMBRO 2017 – PÁGINA 5

Os filmes de terror através dos tempos...
E o que está por trás deles! (2)

O surto de fitas de monstros dos anos 50, quando dezenas de criaturas disformes e ameaçadoras povoaram os pesadelos dos espectadores, é uma consequência do impacto que teve sobre a humanidade a barbárie e a violência da 2ª Guerra Mundial.
Um mundo que supostamente caminharia a passos largos para o progresso e a civilização foi surpreendido pela regressão à selvageria em sua forma mais brutal.
O espanto e a perplexidade das pessoas precisavam ser expressos e expurgados de alguma maneira.
Daí o surgimento desses filmes em que os terrores primitivos irrompiam inopinadamente diante dos homens, corporificando-se nas figuras de seres pré-históricos e de animais que nos são temíveis ou repugnantes (insetos, polvos, aranhas etc), tornados gigantescos devido a qualquer incidente.
Na sua trajetória destrutiva, os monstros realizavam tudo aquilo que os espectadores mais temiam – e, morbidamente, desejavam –, para, afinal, serem exterminados e a ameaça afastada.
Por meio da morte de cada uma dessas criaturas, exorcizavam-se simbolicamente os receios de uma nova guerra.
Isto fica ainda mais claro nas películas japonesas, em que os monstros eram engendrados ou despertavam de uma milenar hibernação a partir, quase sempre, de explosões atômicas.
Os horrores reais de Hiroshima e Nagasaki, demasiadamente latentes na lembrança dos nipônicos, encontravam aí uma expressão atenuada –  pois, afinal, nenhum “Godzilla” maginário poderia causar terror remotamente equiparável ao dos artefatos nucleares.
Outra característica significativa é a apresentação dos monstros como descomunais, evocação óbvia da idade em que o mundo nos parece ameaçador e povoado de seres gigantescos e muito mais poderosos do que nós: a infância.

A ÚLTIMA CENTELHA DO TERROR CLÁSSICO

A partir de 1957, estendendo-se pelos anos 60, o terror clássico tem novo e derradeiro apogeu, com os estúdios britânicos Hammer e Amicus revivendo os velhos mitos das telas (“Drácula”, “Frankenstein”, o lobisomem, a múmia, “Dr. Jeckill/Mr. Hide”, o fantasma da ópera etc), sob a direção competente dos artesãos Terence Fisher, Freddie Francis, Roy Ward Baker e Jimmy Sangster, dentre outros.
Foi, também, a revelação dos dois últimos grandes atores referenciais do gênero: Peter Cushing e Christopher Lee.
Enquanto isto, nos EUA, o genial fabricante em série de “filmes B”, Roger Corman, transpunha em ritmo frenético para as telas os contos de Edgar Allan Poe, com elencos de veteranos ilustres (Vincent Price, Boris Karloff, Peter Lorre, Basil Rathbone, John Carradine, Ray Milland) e uma jovem promessa (Jack Nicholson).
Este  revival  terrorístico foi avaliado por alguns como uma reação à vida insípida e sedentária das metrópoles modernas e ao cipoal burocrático no qual o cidadão comum sente-se enredado e tolhido.
A complexidade das relações sociais em nossa época é tamanha que desperta no homem a nostalgia por desafios simples, inimigos concretos que se pudesse vencer numa luta corpo-a-corpo.
No cotidiano, trabalhamos em companhias das quais só conhecemos os escalões intermediários, enquanto a cúpula está longe, inatingível, como o senhor do castelo kafkiano.
Somos obrigados a cumprir decisões de que não participamos, nem sabemos como foram tomadas.
E tratamos com outras organizações impessoais, como bancos, imobiliárias, repartições públicas, universidades, das quais só conhecemos funcionários, mas jamais atingimos o  todo, o  cérebro.
Quando temos queixas a fazer, acabamos perdidos no labirinto das burocracias.
Se nos sentimos oprimidos ou logrados, dificilmente conseguimos identificar o que vai mal em nossas vidas.
Não seria mais fácil lidar com o “Mal”, um ente definido, poderoso, mas também vulnerável? Não seria preferível combater “Drácula” do que o demônio do vestibular, os ogros dos testes de admissão, o fantasma do desemprego, a esfinge das dificuldades de ascensão econômica e social?
Não seria mais simples queimar o laboratório do barão “Frankenstein” do que livrarmo-nos dos cientistas loucos do governo que nos impõem políticas econômicas monstruosas?
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Esta série especial de artigos sobre cinema, escrita pelo jornalista Celso Lungaretti, continuará no próximo número

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