Pessimismo e realidade (Parte 1)
Divina Scarpim
colaboradora deste Humanitas é professora e escritora. Atua em São
Paulo/SP
“O
mundo é um lugar horrível”, declarou Donald John Trump, presidente dos EUA,
em seu livro Think Big. “Os leões matam por comida, mas as pessoas
matam por esporte”.
E
mais: “A mesma ganância ardente que faz
as pessoas saquearem, matarem e roubarem em situações de emergência - como
incêndios e enchentes - opera diariamente nas pessoas comuns”.
E
ainda: Ela se esconde debaixo da
superfície e, quando você menos espera, levanta sua cabeça tenebrosa e morde
você. Aceite. O mundo é um lugar brutal. As pessoas
vão aniquilar você por pura diversão ou para se exibir para os amigos”.
Nunca
vou elogiar Donald Trump porque ele é e representa o oposto do que defendo como
ética, decência e tudo que vejo como positivo no que se poderia nomear como
humanidade.
No
entanto, lendo o livro A Morte da
Verdade, de Michiko Kakutani, crítica literária norte-americana,
ex-crítica literária chefe do The New
York Times. na página 191, trombei com o trecho acima e sou obrigada a
dizer que me parece muito correto.
O
mundo é, sim, um lugar horrível, e as pessoas matam por esporte, discriminam,
subjugam e humilham outras pessoas usando os argumentos mais esdrúxulos,
contraditórios, falsos e absurdos para “justificar”
todo o mal que praticam.
O
problema com Donald Trump é que escolheu se tornar aquele ser em lugar de
combatê-lo, e o problema com todos os seus apoiadores, admiradores, aliados e
defensores é que fizeram a mesma escolha.
A
maioria das pessoas que admiram, defendem e invejam os predadores mais
poderosos se comportam, nos níveis a que têm acesso, como esse ser humano que
Donald Trump descreveu tão bem.
E
quando um deles consegue algum poder real, como o governo de um país, o mundo
se torna um lugar ainda mais horrível.
Essa
é a história da humanidade.
Sei
que falar em “as pessoas” para
destacar as falhas do animal humano pode parecer que estou generalizando e
dizendo que todas as pessoas se enquadram nessa classificação de predador
abominável, mas sei muito bem que não é assim.
Estou
lendo também o livro Sapiens – Uma
breve história da humanidade, do historiador e escritor israelense
Yuval Noah Harari.
Na
página 26 ele diz que “a tolerância não é
uma marca registrada dos Sapiens.
Nos tempos modernos, uma pequena diferença em cor
de pele, dialeto ou religião tem sido suficiente para levar um grupo de Sapiens a
tentar exterminar outro grupo. Os Sapiens antigos teriam sido mais tolerantes para com uma espécie humana
totalmente diferente?”.
Ou seja, nós, como animais, não somos tolerantes.
Adotamos o assassinato e o extermínio corriqueiramente em
nossa história, possivelmente desde a época em que éramos caçadores coletores.
No mínimo, ajudamos a exterminar os outros Sapiens que dividiram o planeta
conosco naquele período.
Isso não quer dizer que não podemos, como indivíduos e
como grupos, usar a mesma inteligência que nos distingue – da qual temos nos
orgulhado tanto a ponto de, por causa dela, nos julgarmos superiores e mais “evoluídos” do que os outros animais –
para chegarmos à conclusão de que não somos superiores aos outros seres
humanos, não somos os donos e senhores do planeta com direito à exploração
irrestrita da vida que ele contém e podemos e devemos respeitar o outro, seja
humano seja animal, e não causar dano ou nos omitirmos diante do sofrimento de
outro ser vivo.
Podemos sim e muitos de nós, em vários níveis e de várias
formas fazemos isso.
Pertencemos a uma raça animal violenta, danosa e letal,
mas alguns de nós nos recusamos a agir de tal forma, e são essas pessoas que
tornam possível, depois de tudo, ainda ter alguma esperança na humanidade.
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