Para onde vão os silêncios quando
calamos a verdade?
Especial para o Humanitas
Texto de Ana Maria Leandro - uma das
principais colaboradoras do Humanitas -
é escritora e jornalista. Atua em Belo Horizonte/MG
Quero
ver quem tem a coragem de responder sinceramente, com transparência e de forma
objetiva à pergunta da personagem “Mafalda”
do cartunista Quino. “Para onde vão os
silêncios quando calamos a verdade?”
Eu
diria: “Ah! Mafalda, não faça perguntas
difíceis de responder”. Difíceis não porque não saibamos as respostas, mas
porque elas nos doem. Existem verdades que são mantidas muito bem escondidas por
uma vida inteira!
Talvez,
Mafalda, um dia, quando você crescer, você não fará essas perguntas difíceis,
cujas respostas sejam dolorosas. Você é muito inteligente e já sabe as
respostas antes de perguntar. Só faz essas perguntas para ver como os adultos
se saem. Mas os adultos têm dentro de si uma caixinha invisível, onde escondem
as verdades que não querem encarar.
Mas
nós, adultos, devemos no mínimo refletir sobre a pergunta da Mafalda. Quem sabe
esta seja a razão de passarmos a vida desejando o amanhã, que nos traga uma
nova e bela realidade, que não precisemos esconder na pesada caixinha dos
segredos. O que nos pesa é a herança triste das realidades silenciosas.
De
vez em quando tenho um lindo sonho, todo colorido, cheio apenas das realidades
de SER e de VIVER. Aliás, talvez todos nós sonhemos com este mundo maravilhoso.
Então acordamos de vez em quando num assomo de coragem e nos lançamos no
desafio de fazer este mundo onde a realidade é tão linda, que não precisa ser
escondida em nenhuma caixinha interior.
Mas
não temos a competência pata tornar realidade o sonho...
Alegrias
saltitantes, em tempos raros e vez em quando mais frequentes, daqui e dali vão
segurando a nossa vida, apesar da mágoa desta incompetência.
Para
intermediar os tempos vazios de alegria, ficamos a viver de ilusões místicas,
se não for o bem que “virá” ainda em vida, pelo menos, quem sabe, o
mundo do “depois da vida”.
O
céu fulgurante do paraíso atrai irresistivelmente.
Existem
“homens-bomba” que crêem tanto nisso, que se rebentam para experimentar esse “depois”. Há
fartura de fontes de culturas, escritos e crenças, para saciar este sonho do
paraíso.
Naturalmente
porque, na realidade, a manutenção de tais culturas rendem bastante, o que faz
com que permaneçam através dos milênios.
E
a maioria acha que vale a pena se utilizar dessas muletas...
Veja
por exemplo a política vigente em nosso país.
Muitos
políticos vivem a prometer o país das maravilhas. E repetem anos a fio a mesma
ladainha de promessas, e o povo, cansado de sofrer, se esquece dos sofrimentos
para tentar “de novo”, para ver se desta vez “dá certo”.
Muitos se aproveitam largamente dessa eterna
esperança humana, para viver milhões de vezes melhor do que todos que
acreditaram. Fala-se, por exemplo, em “redução de gastos do governo”,
mas nem se toca na possibilidade de redução dos ganhos nababescos dos líderes.
Aqueles mesmo que fizeram promessas de melhoria para o povo.
Eles
as cumpriram sim: para si e para a própria família!...
Pergunte
a eles depois, “Mafalda”, para onde
foram as promessas que fizeram ao povo? Vão desconversar e enviar as respostas
para as caixinhas que têm dentro de si. Silêncio sobre a realidade.
Mas você “Mafalda” ou melhor,
Quino, o criador de seu personagem, sabe muito bem a resposta...