terça-feira, 19 de setembro de 2017

NOSTÁLGICOS DA IDADE MÉDIA



Texto de Rafael Rocha – Editor do HUMANITAS

A nostalgia dos tempos negros da Inquisição está de volta ao Brasil. Essa nostalgia remete o país ao atraso, quando se proíbe “ilegalmente” peças teatrais e quando o poder judiciário entra em ação para, de forma arbitrária, apoiar e dizer que o homossexualismo é uma doença que deve ser tratada.
É assustador que um juiz de primeira instância cometa “abuso de poder”, passando por cima da Carta Magna e do seu artigo 5º, anulando os direitos e os deveres individuais e coletivos dos brasileiros.
Diz nossa Constituição: “IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;” mas o meritissimo senhor juiz Luiz Antonio de Campos Jr., titular da 1ª Vara Cível de Jundiaí (SP) mostra que nunca leu a Carta de 1988.
Decidiu por si mesmo que ninguém assistiria a peça O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu”, que reconta a história bíblica tornando Cristo uma mulher transgênero, alegando que figuras religiosas e sagradas não podem ser expostas ao ridículo”.
Nenhum juiz tem autoridade para impor censura prévia a espetáculos teatrais. A obrigação do Judiciário é a de fazer cumprir as leis, que vedam toda e qualquer forma de censura prévia.
Infelizmente, o ilustre meritíssimo não conciliou essas partes e, portanto, o mais lógico a fazer seria abandonar a toga, devido à sua própria incompetência de julgar e de prejulgar.
É lamentável termos que comentar aqui neste espaço essa grotesca tentativa de fazer o Brasil regredir aos anos terríveis da ditadura militar, com a medonha censura prévia, agora por parte de um judiciário, que através dessa ação mostra sua total inépcia.
O Brasil é um estado laico há mais de 120 anos por força do Decreto nº 119-A, de 07/01/1890, de autoria de Ruy Barbosa e isso também está inserido na nossa Carta Magna.
Em estados laicos, as figuras religiosas e sagradas podem ser, sim, expostas ao ridículo em representações teatrais”, assim como os espectadores indignados podem depois acionar os tribunais para que os responsáveis sejam eventualmente punidos. 
Por outro lado, adentrando mais fundo na ignorância e no atraso o juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da Justiça do Distrito Federal liberou psicólogos a tratarem gays e lésbicas como doentes, podendo fazer terapias de “reversão sexual”, sem sofrerem qualquer tipo de censura por parte dos conselhos de classe.
Ele esqueceu ou não quis levar em consideração que desde 1990 a homossexualidade deixou de ser considerada doença pela Organização Mundial da Saúde.
Quem tem razão é o Conselho Federal de Psicologia, quando salienta que terapias de reversão sexual representam “uma violação dos direitos humanos e não têm qualquer embasamento científico”.
O que temos aqui é o uso da máquina judiciária para destruir conquistas da Humanidade no que tange aos seus direitos. Os dois juízes são agora motivo de piadas no Brasil e no Exterior. Em Portugal já se diz que os juízes brasileiros são os primeiros a ignorarem as leis. E isso está se tornando realidade ou já é uma realidade.
Falta de embasamento jurídico ou má fé ou simplesmente uso do poder como forma de coerção? Pelo que vemos, o judiciário brasileiro está agindo por convicção ou oportunismo e tomando posição com os nostálgicos da Idade Média e da ditadura militar de triste lembrança.

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