Um Feliz Você Novo...
Ana Maria Ferreira Leandro – colaboradora
do Humanitas - é escritora e
jornalista. Atua em Belo Horizonte/MG
Era
um fim de ano e eu atuava na direção de uma escola. Uma chuvinha passageira,
típica mensagem de um sol escondido atrás de nuvens cessava lentamente. Súbito,
o sol brilhante e penetrante surgiu por trás de nuvens contornadas pelo brilho
dos raios. Um maravilhoso e multicolorido arco-íris se projetou na abóbada
celeste, parecendo tão próximo como se possível fosse alcançá-lo.
No pátio coberto da escola
cercado por grandes colunas, que davam passagem para a área externa, as
crianças batiam palmas e gritavam extasiadas, pois o arco-íris é sempre para
elas um motivo de festa!
Percebi então um garotinho
quietinho, assentado no primeiro degrau da escadaria, pensativo a olhar,
surpreendentemente com tristeza, o fenômeno natural. Aproximei-me cautelosa,
com medo de interromper uma divagação interior, que ele não quisesse dividir e
assentei-me ao seu lado. Mas ele, tirando os olhos do infinito, fitou-me
perguntando:
- É verdade que a felicidade está
no fim do arco-íris?
Surpreendi-me com a pergunta! Não
era próprio de sua idade colocar a felicidade em um ponto, como algo móvel.
Sem lhe responder de imediato,
querendo sondar melhor o fundamento de sua pergunta, retruquei-lhe com outra
pergunta cautelosa:
- Por que você quer saber isto,
meu bem?
-
Para ir até lá e buscá-la para minha mãe. Ela disse que a vida é muito ruim e
que ela nunca conheceu a felicidade.
Um aperto amargo perpassou-me o
peito. Fiquei a me perguntar que direito tinha um adulto de transferir a uma
criança, o compromisso (inconscientemente assumido) de lhe trazer a felicidade?
Tomei-lhe as mãozinhas miúdas
entre as minhas e respondi:
- Querido, a felicidade não está
no fim do arco-íris. Muito embora, vê-lo, já possa ser uma forma de felicidade.
O simples de querer fazer feliz sua mãe feliz, já poderia ser para ela uma
forma de felicidade; embora talvez, ela ainda não se tenha dado conta disto.
Assim é a felicidade; está em todos os lugares, e ao mesmo tempo não está em
lugar algum. Sua mamãe precisa encontrar a felicidade dela onde ela estiver da
forma como ela quer e acredita.
Não me esqueço do episódio já
citado em outras obras minhas, porque me surpreende como os adultos conseguem
transferir para episódios fora de seus controles, o poder de ser ou de não ser
feliz.
E uma passagem de ano é sempre um
fato vivido como se a vida pudesse se alterar pela simples virada de um calendário
civil.
Existem indícios que mesmo em
eras pré-históricas, alguns homens já se preocupavam em marcar o tempo.
Há cinco mil anos, os antigos
sumérios tinham um calendário bem parecido com o nosso, com um ano dividido em
12 meses de 30 dias, o dia em 12 períodos e cada um desses períodos em 30
partes.
O calendário civil foi feito pelo
homem e, claro, não o inverso.
Não foi o calendário que fez as
etapas de sua história, mas sim o que você registrou nesse caminho.
Assim, por exemplo, molhar os pés
nas águas do mar na passagem do ano é para muita gente fundamental para que a
vida “se renove”.
Como se existisse vida sem “ser”.
E como se “renovação” fosse algo como um objeto, inerente ao ser, ao seu
pensar, seu agir em direção à realização de ideais.
Outros “mitos” se somam a
esta panaceia de fatores capazes de se tornarem mais fortes do que o próprio
homem.
Na realidade o personagem
principal de uma vida é sempre o próprio ser que a vive. E a vida não é um
pacote de soluções compradas, mas construída por cada um.
Não existe renovação! O “novo”
é resultado de mudanças pessoais, que encaramos para o encontro de nós mesmos e
por consequência da vida que desejamos. Erramos muitas vezes nesses percursos,
mas não tem importância, não é preciso esperar outro começo de ano para planos
e expectativas, pois todo dia é um novo dia de recomeço.
Busque sim, momentos de
organização e planejamento da realização de expectativas, de fortalecimento ao
crédito em si mesmo da maneira que julgar mais prazerosa e eficaz para você. E
se você não aceitar este “novo” feito por você, que não há como delegar
a terceiros, nem mesmo precisará do tempo para encontrar o envelhecimento
interior.
De fato “inovar-se” exige
um revisar constante de ideias; uma disposição incansável de busca; uma
exigência implacável de crescimento e evolução.
Este é o preço do Feliz Você tão
Procurado.
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