A
RAINHA NEGRA QUE DESAFIOU PORTUGAL
Especial do Humanitas
Aconteceu no
Século XVIII! Uma negra desafiou a coroa portuguesa e o sistema escravocrata
por mais de vinte anos. O nome dela era Tereza, e ficou conhecida na história
da luta das mulheres negras como a “Rainha Tereza de Benguela”, por
comandar a maior comunidade de libertação de negros e indígenas da capitania de
Mato Grosso.
Dificilmente,
alunos das nossas escolas vão encontrar o nome dessa mulher nos livros da “história oficial”, nem que seja por
alto ou de forma rápida. A “história
oficial” relega ao esquecimento os verdadeiros mártires da liberdade. A “história oficial” é escrita pelos donos
do poder.
Na época do
Brasil/Colônia existiram vários núcleos de resistência ocupados por negros em
fuga da escravidão, indígenas e brancos pobres. Foram denominados de quilombos
e seus habitantes de quilombolas ou mocambeiros. Esses nomes aparecem na
documentação oficial desde o século XVI, mas todos seus integrantes eram
considerados foras da lei pela poder dominante.
O quilombo mais
conhecido entre nós é o de Palmares, e se localizava na Serra da Barriga,
Alagoas. Este quilombo foi considerado por muitos especialistas um “estado
africano no Brasil”, e por outros como a “República de Palmares”
devido à sua extensão territorial.
Seu líder, “Zumbi
dos Palmares”, foi decapitado, mas a historiografia não sabe precisar ao
certo como ocorreu a sua morte.
“Zumbi dos
Palmares” faleceu no dia 20 de novembro de
1695. Por isso, o “Dia da Consciência Negra” é comemorado nesta data, com a
finalidade de homenagear toda a população negra que lutou bravamente pela
libertação do açoite, que liderou levantes em busca da liberdade e que
construiu o patrimônio social e cultural brasileiro.
Mas quem foi
Tereza de Benguela? A “Rainha Tereza”, como ficou conhecida em seu
tempo, viveu no século XVIII no Vale do Guaporé, no Mato Grosso.
Ela liderou o
Quilombo de Quariterê após seu companheiro José
Piolho ser morto. Segundo documentos da época, o quilombo abrigava mais de 100
pessoas, com aproximadamente 79 negros e 30 indígenas e resistiu da década de
1730 até o final do Século XVIII.
A liderança de
Tereza ganhou destaque com a criação por parte dela de uma espécie de
Parlamento e de um sistema de defesa no quilombo. Ali se cultivava o algodão,
que servia posteriormente para produzir tecidos. Mas também existiam plantações
de milho, feijão, mandioca, banana, entre outros.
Os objetos de
ferro utilizados contra a comunidade negra que lá se refugiava eram
transformados em instrumento de trabalho, visto que dominavam o uso da forja.
Tereza de
Benguela foi a líder de um levante de negros e índios, instalando-se próximo a
Cuiabá, não muito longe da fronteira com a atual Bolívia. Durante décadas, ela
esteve à frente do quilombo, o qual sobreviveu até 1770, século XVIII. Foi morta após ser capturada por soldados no ano de 1770.
Documentos da
época afirmam que: “em poucos dias
expirou de pasmo. Morta ela, se lhe cortou a cabeça e se pôs no meio da
praça daquele quilombo, em um alto poste, onde ficou para memória
e exemplo dos que a vissem”.
No Vale do
Guaporé, “Rainha Tereza” coordenava a estrutura administrativa,
econômica e política da comunidade, garantindo a segurança e a sobrevivência de
mais de 100 pessoas, entre negros e indígenas. Nos dias de hoje, junto com
outras tantas lideranças femininas que ressurgem por causa da luta de alguns
historiadores que as retiram do esquecimento oficial, Tereza tornou-se um
símbolo de liderança, força e luta pela liberdade.
A história de
Tereza de Benguela demorou a ganhar projeção. Passados quase 250 anos, o
reconhecimento começa a aparecer.
Uma lei aprovada
em 2014 pela presidente Dilma Rousseff instituiu o dia 25 de julho como o “Dia Nacional de Teresa de Benguela e da
Mulher Negra”.
A luta de Tereza
de Benguela ainda não está perto de terminar. Números do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que ser mulher negra no Brasil
significa sofrer intensa desigualdade.
Os três séculos
de escravidão no Brasil, que só teve fim por conta da brava resistência dos
negros escravizados, deixaram marcas profundas.
Tão profundas
que, apesar da posse do corpo ter acabado, a discriminação ainda persiste.
No
trabalho, 71% das mulheres negras estão em ocupações precárias e
informais, contra 54% das mulheres brancas e 48% dos homens brancos.
O salário médio da trabalhadora negra continua sendo a metade
do salário da trabalhadora branca. Mesmo quando sua escolaridade é similar
à escolaridade de uma mulher branca, a diferença salarial gira em trono de
40% a mais para esta.
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