Texto de Manfred Grellmann – Camaragibe/PE
Publicado no HUMANITAS nº 22 – Maio/2014 – Página 5
Os
smartphos-zubis ou face-zumbis
são
um gritante exemplo destes
vícios
estranhos ainda desconhecidos
há
cerca de duas décadas
A quantidade de
problemas que o mundo moderno, turbinado pela tecnologia, tem acumulado, criou
um estado muito difícil para ações efetivas de reorganização da
sociedade para que ela possa se sustentar de forma duradoura. Obviamente,
há gente capaz de fazê-lo, como demonstram ações pontuais e ainda é
possível, mas a súcia do poder, da maldade destruidora, é mais
forte. Já fiz perguntas a pessoas como se elas já pensaram alguma vez de que
é mais do que necessário se decidir pelo abandono de certas tecnologias,
cancelamento da fabricação de vários produtos e materiais, principalmente
aqueles que não podem ser reciclados? Este tipo de pergunta surpreende e
incomoda, porque todo mundo só conhece desenvolver, criar, novo, índice maior,
crescimento, desenvolvimento, descartar e aquilo que está na moda.
As pessoas se esquecem completamente que crescer, subir, desenvolver tem
limites, que o tipo de sociedade que conhecemos e endeusamos tem
seus dias contados. Não há escada que só tem começo, mas não tem fim.
Então, o que está aí, com a filosofia que permeia as cabeças,
é uma monstruosa armadilha que, para ser desarmada é literalmente
impossível! O desarme acontecerá, infelizmente, pelo terrível preço do
desastre! Somos homens destinados ao suicídio coletivo! Mas, isto é tema quase
inesgotável O que desejo abordar, é algo muito menor e inocente até, porque: o pequeno
está no grande, e o grande está no pequeno.
Em uma feira de rua num sábado em São Paulo, parei em uma
barraca para tomar um caldo de cana. Enquanto saboreava, notei que não havia
refrigerantes nela, tampouco nas redondezas da feira. Ao que indaguei o porquê
disso. O proprietário respondeu dizendo que era uma imposição da
prefeitura. A resposta me causou surpresa e não ficou sem questionamento.
A explicação: a prefeitura reconhece que se for oferecido
caldo de cana e refrigerantes, os fregueses tomarão somente refrigerantes
e não caldo de cana, que é muito mais saudável .
Absurdo, não? Cadê a liberdade de escolher o que se
quer vender e beber?
Um fenômeno recente que se configura em um
comportamento de exclusão social, de alienação, de comportamento drogado,
literalmente de alienação social, são os smartphon-zumbis. É uma praga planetária.
É fácil chegar em algum lugar e ter a sensação de estar num espaço vazio.
Ou seja, não há ninguém, porque todos os presentes estão
conectados! Não há forma mais clara de qualificar, exemplificar um zumbi.
Basta olhar para uma figura destas, teclando com vista congelada e imóvel na
tela!
Recentemente, numa fila de banco, ouvi um frenético e veloz
teclar em um celular com uma mão apenas. Era uma moça repetindo um jogo
eletrônico com pequenos intervalos com olhar perdido pelo espaço, quando ela
recomeçava tudo novamente. Me passou a imagem da artificialidade humana
de um mundo sem perspectivas reais ou sentido de vida, uma agonia de não saber
como direcionar suas expectativas, se é que as tem, de forma sadia, cujo
mundo se resume no horizonte da tela digital. Sem dúvida, este
aspecto novo como muitos outros da sociedade moderna, é um caminho sem volta
que irá contribuir para o possível suicídio da espécie ou redução a
poucos exemplares.
Pois bem! Há outros exemplos de práticas absurdas que se
instalaram entre os povos. Recentemente, li sobre estudos que mostram que
as áreas cerebrais que são ativadas de forma viciante no consumo de drogas,
álcool, cigarro etc, são também as mesmas acionadas por sentimentos
fortes, como paixões.
Na literatura não faltam exemplos de vidas destruídas
por paixões arrebatadoras, sejam elas quais tenham sido. O comportamento
viciante da era digital é certamente uma surpresa para os desdobramentos
das manias que o cérebro consegue desenvolver.
Os smartphos-zubis ou face-zumbis são um gritante exemplo
destes vícios estranhos ainda desconhecidos há cerca de duas
décadas. No estado de São Paulo, recentemente, uma mulher foi internada
em uma clínica para tratamento de drogados, não porque ela era viciada em
crack, cocaína, heroína etc.
Mas porque não conseguia largar seu celular ou
computador acessando as redes sociais, fato que a fez esquecer de levar a
filha para a escola, de dormir, de comer e finalmente perder o emprego
e observar o fim de seu casamento.
Neste mundo travestido pela mídia e a falsa propaganda
novos problemas e vícios minimizam e se sobrepõem a antigos, fazendo com que os
referenciais de conduta se desloquem de forma impercebível
para a maioria esmagadora, que confunde alteração com evolução e
modernismo, e muito menos veem nisto algum processo de degradação.
Desde o início da televisão, pensadores alertavam sobre
malefícios deste meio de comunicação da forma como estava sendo usado. Coisas
como destruição do diálogo, visitas que transcorriam em silencio, não raro, as
únicas frases trocadas eram boa noite na chegada e até logo na saída.
Expor as crianças a assuntos que ainda não estavam maduras
para uma confrontação. A péssima qualidade dos programas, desde o início
nivelados por baixo e até chamados, na época, de eventos culturais.
Não se pode trabalhar, concentrar-se ou conversar quando a TV
está ligada. Tipicamente este equipamento é para ser usado em momentos de tempo
livre e vontade de assistir àquilo que se deseja, seja informação ou
distração.
Ora, a TV já impõe nos lares um desligamento social e
coloca o diálogo em família na UTI. E quando há algum diálogo é
sobre o lixo, não o tratamento do lixo, mas sobre o lixo “cultural” chamado:
NOVELA e, pior, BBB !
Onde estamos e quanto caminho ainda falta para chegar ao fim!?
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