quarta-feira, 30 de abril de 2014

Todo começo é uma célula, um grão



Texto de Manfred Grellmann – Camaragibe/PE 
 Publicado no HUMANITAS nº 22 – Maio/2014 – Página 5

 Os smartphos-zubis ou face-zumbis
são um gritante exemplo destes
vícios estranhos ainda desconhecidos
há cerca  de duas  décadas
 
A quantidade de problemas que o mundo moderno, turbinado pela tecnologia, tem acumulado, criou um estado muito difícil para ações efetivas de reorganização da sociedade para que ela possa se sustentar de forma duradoura. Obviamente, há gente capaz de fazê-lo,  como demonstram ações pontuais e  ainda é possível,  mas a súcia do poder, da maldade destruidora, é mais forte. Já fiz perguntas a pessoas como se elas já pensaram alguma vez de que é mais do que  necessário se decidir pelo abandono de certas tecnologias, cancelamento da fabricação de vários produtos e materiais, principalmente aqueles que não podem ser reciclados? Este tipo de pergunta surpreende e incomoda, porque todo mundo só conhece desenvolver, criar, novo, índice maior, crescimento, desenvolvimento, descartar  e aquilo que está na moda. As pessoas se esquecem completamente que crescer, subir, desenvolver tem limites, que o tipo de sociedade que conhecemos e endeusamos tem seus dias contados. Não há escada que só tem começo, mas não tem fim.
Então, o que está aí, com a filosofia que permeia as cabeças, é uma monstruosa  armadilha que, para ser desarmada é literalmente impossível! O desarme acontecerá, infelizmente, pelo terrível  preço do desastre! Somos homens destinados ao suicídio coletivo! Mas, isto é tema quase inesgotável O que desejo abordar, é algo muito menor e inocente até, porque: o pequeno está no grande, e o grande está no pequeno.
Em uma feira de rua num sábado em São Paulo, parei em uma barraca para tomar um caldo de cana. Enquanto saboreava, notei que não havia refrigerantes nela, tampouco nas redondezas da feira. Ao que indaguei o porquê disso. O proprietário respondeu dizendo que era uma imposição da prefeitura. A resposta  me causou surpresa e não ficou sem questionamento.
A explicação: a prefeitura reconhece que se for oferecido caldo de cana e refrigerantes, os fregueses tomarão somente refrigerantes  e não caldo de cana, que é muito mais saudável .
Absurdo, não? Cadê a liberdade de escolher o que se quer  vender e beber?
Um fenômeno recente  que se configura em  um comportamento  de exclusão social, de alienação, de comportamento drogado, literalmente de alienação social, são os smartphon-zumbis. É uma praga planetária. É fácil chegar em algum lugar e ter a sensação de estar num  espaço vazio.
Ou seja, não há ninguém, porque todos os presentes estão conectados! Não há forma mais clara de qualificar, exemplificar  um zumbi. Basta olhar para uma figura destas, teclando com vista congelada e imóvel na tela!
Recentemente, numa fila de banco, ouvi um frenético e veloz teclar em um celular com uma mão apenas. Era uma moça repetindo um jogo eletrônico com pequenos intervalos com olhar perdido pelo espaço, quando ela recomeçava tudo novamente.  Me passou a imagem da artificialidade humana de um mundo sem perspectivas reais ou sentido de vida, uma agonia de não saber como direcionar  suas expectativas, se é que as tem, de forma sadia, cujo mundo se resume no  horizonte da tela  digital. Sem dúvida, este aspecto novo como muitos outros da sociedade moderna, é um caminho sem volta que irá contribuir para  o possível  suicídio da espécie ou redução a poucos exemplares.
Pois bem! Há outros exemplos de práticas absurdas que se instalaram  entre os povos. Recentemente, li sobre estudos que mostram que as áreas cerebrais que são ativadas de forma viciante no consumo de drogas, álcool, cigarro etc, são também as mesmas  acionadas por sentimentos fortes, como  paixões.
Na literatura não faltam exemplos de vidas destruídas por  paixões arrebatadoras, sejam elas quais tenham sido. O comportamento viciante da era digital é certamente uma surpresa  para os desdobramentos das manias que o cérebro consegue desenvolver.
Os smartphos-zubis ou face-zumbis são um gritante exemplo destes vícios estranhos ainda desconhecidos há cerca  de duas  décadas. No estado de São Paulo, recentemente, uma mulher foi  internada em uma clínica para tratamento de drogados, não porque ela era viciada em crack, cocaína, heroína etc.
Mas porque não conseguia  largar seu celular ou computador acessando as redes sociais, fato que  a fez esquecer de levar a filha para a escola, de dormir, de comer e finalmente perder o emprego e observar o fim de seu casamento.
Neste mundo travestido pela mídia e a falsa  propaganda novos problemas e vícios minimizam e se sobrepõem a antigos, fazendo com que os referenciais de conduta se desloquem  de forma  impercebível  para a maioria esmagadora, que confunde alteração com evolução e modernismo, e muito menos veem nisto algum processo de degradação.
Desde o início da televisão, pensadores alertavam sobre malefícios deste meio de comunicação da forma como estava sendo usado. Coisas como destruição do diálogo, visitas que transcorriam em silencio, não raro, as únicas frases trocadas eram boa noite na chegada e até logo na saída.
Expor as crianças a assuntos que ainda não estavam maduras para uma confrontação. A péssima qualidade dos programas, desde o início nivelados por baixo e até chamados, na época, de eventos culturais.
Não se pode trabalhar, concentrar-se ou conversar quando a TV está ligada. Tipicamente este equipamento é para ser usado em momentos de tempo livre e vontade de assistir àquilo que se deseja, seja  informação ou distração.
Ora, a TV já impõe nos lares um desligamento social e  coloca o  diálogo em família na UTI. E quando há algum diálogo é sobre o lixo, não o tratamento do lixo, mas sobre o lixo “cultural” chamado: NOVELA e, pior, BBB !
Onde estamos e quanto caminho ainda falta para chegar ao fim!?

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