quarta-feira, 31 de julho de 2019

HUMANITAS Nº 86 - AGOSTO DE 2019 - PÁGINA 3

REFÚGIO POÉTICO – CARTAS DOS LEITORES
                                                                                     

Motivo

Cecília Meireles (1901/1964)

Rio de Janeiro/RJ

 

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

Cecília Benevides de Carvalho Meireles, foi uma jornalista, pintora, poeta e professora brasileira.
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A jaula
Alexandra Pzarnik
1936/1972 - Argentina

Lá fora faz sol.
Não é mais que um sol
mas os homens olham-no
e depois cantam.

Eu não sei do sol.
Sei a melodia do anjo
e o sermão quente
do último vento.
Sei gritar até a aurora
quando a morte pousa nua
em minha sombra.

Choro debaixo do meu nome.
Aceno lenços na noite
e barcos sedentos de realidade
dançam comigo.
Oculto cravos
para escarnecer meus sonhos enfermos.

Lá fora faz sol.
Eu me visto de cinzas.

Alejandra Pizarnik foi uma escritora e poetisa argentina. Tradução do poema por Virna Teixeira
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Fingimento
Francisco Carvalho
1927/2013 – Russas/CE

Não adianta fingir
que o tempo não passou
com os seus pendões vacilantes
de cortejo fúnebre.

Fingir que o rosto não foge
ao sarcasmo dos espelhos.
Que os deuses não zombam
do sorriso trincado dos velhos.

Fingir que ainda restam
vestígios da antiga chama.
- Sob o desenho das rugas
só o silêncio nos ama.

Francisco Carvalho foi um escritor e poeta brasileiro.
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Hora da partida
Sophia de Mello Breyner Andresen
1919/2004 - Portugal

A hora da partida soa quando
Escurece o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.

A hora da partida soa quando
as árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.

Sophia de Mello Breyner Andresen foi uma das mais importantes poetisas portuguesas do século XX e a primeira mulher portuguesa a receber o mais importante galardão literário da língua portuguesa, o Prémio Camões, em 1999
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CARTAS DOS LEITORES

Parabéns por mais um ano de vida. Ivani Medina – Rio de Janeiro/RJ.
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Fico orgulhosa e feliz em parabenizar o Humanitas por mais um ano de vida e por ser uma de suas mais antigas leitoras, desde o site Cultura & Humanismo criado pelo meu amigo jornalista Rafael Rocha. Parabéns! – Jaqueline Ventapane – Rio de Janeiro/RJ

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