sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

HUMANITAS Nº 66 – DEZEMBRO DE 2017 – PÁGINA 4



OS FILMES DE TERROR ATRAVÉS DOS TEMPOS...
    E O QUE ESTÁ POR TRÁS DELES          
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Celso Lungaretti é jornalista. Mora e atua em São Paulo/SP

O SANGUINOLENTO TERROR ZOOLÓGICO
Na década seguinte, veio a voga do terror zoológico, desencadeada em 1975 por Tubarão, de Steven Spielberg.
Dessa vez, o homem se via confrontado por animais de dimensões comuns (cobras, abelhas, aranhas, cães, polvos, baleias, piranhas), mas que, por conta dos desvarios ecológicos ou de experiências científicas malogradas, voltavam-se contra ele.
São filmes em que se percebe certo complexo de culpa pelos danos causados à natureza e às espécies animais, mas, ao mesmo tempo, aprofunda-se o fosso entre o homem e a vida selvagem.
Ou seja, parecem reforçar o condicionamento dos urbanoides que subsistiam em oposição ao habitat natural, reconfigurando-o ao invés de harmonizar-se com ele.
Além disso, a crueza com que são mostrados os ataques de animais contra seres humanos denuncia uma enorme carga de agressividade reprimida nas plateias, que vibravam ao verem gente sendo estraçalhada.
A morbidez se manteve nos anos 80, com dilacerações explícitas salpicando de sangue os espectadores.
O psiquiatra Thomas Radecki disse certa vez que existiam mais de mil estudos científicos e reportagens sobre a violência desmedida nos filmes, sendo que 75% deles concluíram que havia um sensível aumento de atitudes antissociais e violentas depois de as pessoas assistirem a tais filmes.
A FÚRIA DAS CRIANÇAS MIMADAS
O público-alvo desse terror de base sadomasoquista era o juvenil e adolescente.
Praticamente desde o início da década de 1980, nas salas de exibição a predominância passou a ser dos menores de 18 anos, daí a produção ter sido cada vez mais direcionadas para estas faixas etárias. E, com a disseminação do VHS e do DVD, o terror para jovens virou verdadeira mania.
Tratava-se de um filão em que o sobrenatural tinha como adversários não mais os amadurecidos mestres em ocultismo, mas sim garotos e rapazes; as carnificinas alternavam-se com alívios cômicos; e a trilha sonora era de  heavy metal.
A extrema agressividade implícita nos jovens consumidores dessas fitas advinha do narcisismo exacerbado que as crianças desenvolvem na sociedade de consumo.
Mimadas e paparicadas à exaustão sentem como um crime de lesa-majestade os golpes que a realidade vai desferindo contra suas ilusões de onipotência, daí a agressividade que acumulam e para a qual esses filmes ofereciam projeção e catarse.
Além disso, após o período dourado da juventude vem o ingresso na sociedade extremamente competitiva dos dias atuais, a começar pela guilhotina do vestibular.
Os filmes em que jovens derrotam vampiros e monstros são simbolizações dos ritos de passagem, servindo magicamente para revigorar a confiança dos adolescentes quanto a enfrentar com êxito os desafios que marcarão sua transição para o mundo dos adultos.
E a liberação sexual que vinha num crescendo desde a os anos 60 não era isenta de castigos (simbólicos). Grande parte desses filmes, e a série Sexta-feira 13 em especial, insistia em mostrar, ad nauseam, jovens namorados sendo trucidados por entes malignos logo após terem mantido relações sexuais.
O outro personagem emblemático do final do século XX foi Freddy Krueger, um fantasma que assombrava os sonhos da moçada da rua em que ele havia sido linchado, podendo até causar a morte de quem não acordasse depressa. 
O ponto de partida – um embaralhamento dos limites entre sonho e realidade – foi ótimo, mas a série se estendeu até a saturação. Vale pelos dois filmes que o criativo Wes Craven  dirigiu:  A hora do pesadelo (1984) e  O retorno de Freddy Krueger (1994), no qual a entidade, consegue sair da dimensão onírica e interagir com realizadores e atores (estes assumindo dois papéis, o de seus personagens e o deles próprios).

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