quinta-feira, 4 de setembro de 2014

HUMANITAS Nº 27 – SETEMBRO/2014 – PÁGINA 7

NADA NO UNIVERSO PROVA QUE EXISTE UM DESIGN INTELIGENTE

Divina de Jesus Scarpim – São Paulo/SP


Mesmo que a ciência concluísse que uma espécie qualquer de mente "incriada" seria necessária para explicar a existência, ainda assim um deus não faria sentido. Por que essa "mente" teria que ser deus? E, mais ainda, por que teria que ser o deus dos cristãos?
O físico Stephen Hawking já mostrou que deus não é necessário para explicar a existência do universo: “Não é necessário que evoquemos um deus para iluminar as coisas e criar o universo”. Dai que esse "incriado" não TEM que existir.
Mesmo que existisse esse design, na minha visão ele teria que ser algo muito diferente do que se pode chamar deus, pelo menos do deus que os seres humanos costumam cultuar em igrejas, templos e sinagogas.
Para começar o que os teístas chamam deus, de acordo com eles, teria criado o mundo para o homem; seria uma entidade que "cuida" do homem, ao ponto inclusive de se preocupar com sua vida sexual e com a sua dieta alimentar.
Em minha opinião, se essa "mente" criadora existisse e teoricamente tivesse dado início ao Big Bang certamente seria algo totalmente indiferente ao homem; e não só ao homem como também a todos os outros animais e até, provavelmente, ao próprio planeta Terra.
Tiro essa conclusão olhando em volta e para mim. Nem eu, nem a natureza, nem o planeta parecemos criações de uma mente inteligente, preocupada e atenta.
Na minha visão, se existisse – e não creio que exista – esse “iniciador do big bang” teria que ter outro nome, não deus; e não faria absolutamente nenhum sentido rezar, orar ou mesmo ter "pensamentos fortes" a respeito de tal "mente".
Hawking mostrou como a física pode provar que é possível do nada surgir alguma coisa. Dai que ele simplesmente matou o último argumento teísta. É claro que ainda falta muito para que esses estudos sejam consolidados, mas o caminho foi aberto.
Em se confirmando os estudos de Hawking, não tem que ter nada antes do princípio de tudo, não tem que existir ou ter existido nenhum “incriado”.
Não sei você, mas eu levo mais a sério os argumentos do Hawking do que os de qualquer teísta que eu conheça. Esclarecendo: pelo que entendi, Hawking não fala de um “universo incriado”. Fala de um universo que se criou do nada sem ter um criador. Não é a mesma coisa.
A diferença básica é que o teísmo, até o de Spinoza, nunca deixa de atribuir uma “mente” a esse início. Quando definem "design inteligente" estão colocando na palavra "inteligente" também o sentido de racional. Essa mente teria um propósito, um objetivo, uma vontade.
Nunca vi ou li nada de nenhum teísta que se parecesse com a defesa de um deus que não tivesse mente. Acho isso bem lógico, afinal, qual seria o propósito de adorar um criador inanimado?
Já o argumento de Hawking, que é mais do que argumento porque é resultado de pesquisas na área da física, não aponta para nenhum tipo de mente, inteligência ou propósito.
O início do universo seria tão natural quanto o início do raio, com a diferença de que o raio tem um agente provocador que incita a ideia de uma “corrente” de agentes provocadores, e o início do universo não teria. Será que consegui me explicar?
O deus de Spinoza, assim como o deus de qualquer cientista teísta moderno, ainda tem características de entidade, portanto ainda pode ser denominado deus.
O que Hawking demonstrou como início não é entidade: é nada! Não há como adorar o nada.
Existiram muitos filósofos, cientistas e pensadores que raciocinaram sobre deus. O problema é que todos eles raciocinaram SOBRE DEUS e não sobre a possibilidade da existência e da não existência de deus.
Eles partem sempre da existência de deus como verdade inquestionável e a partir daí constroem todo seu arcabouço lógico-filosófico; e, quando falam sobre a existência de deus, falam para mostrá-la como verdade, para convencer os que porventura duvidam.
Nesse ponto, eles “dão nó no cérebro” e chegam a dizer os absurdos mais disparatados, como é o caso de Leibniz que disse que este é “o melhor dos mundos possíveis”.
No caso da fé, nunca, nunca vi alguém justificando sua fé de forma realmente racional, nem no dia-a-dia, nem nos livros que li. Normalmente a justificação da fé é egoísta (egoísmo esse que a pessoa nega com toda veemência).
Vejamos: deus é bom porque curou de uma doença (meu filho, minha, mãe, eu mesmo, meu irmão...); deus é bom porque salvou de um acidente grave (meu filho, minha, mãe, eu mesmo, meu irmão...); deus é bom porque “operou” maravilhas na vida de (meu filho, minha, mãe, eu mesmo, meu irmão...).
Por aí vai.
Ora, se não é para todo mundo não é justiça nem é bondade, principalmente vindo de um ser onipotente.
Nisso ninguém pensa.

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