VIVER: QUE ATO MAIS ILÓGICO E INSANO SERÁ ESSE?
Araken Vaz Galvão - Valença/BA
Tenho dito em várias ocasiões que em dias
abafados, como os que ocorrem no litoral da Bahia, quando uma inesperada tormenta
ameaça cair, sem que isso se concretize cabalmente; em dias em que o calor se
faz opressivo; em que o ar se faz pesado e o ato de respirá-lo se torna
fatigoso, sou dado a praticar ocultas filosofias – daquelas, talvez, “que nenhum Kant escreveu” –, das que se
aproximam bastante da metafísica.
No entanto, sou obrigado a reconhecer
que não são dignas daquelas comuns aos grandes mestres, pois são mais próximas
da chã filosofia daqueles que buscam (como eu), desesperadamente (mas em vão),
uma explicação para esse ato insano que é viver.
Mais além de que ele, o ato de viver,
seja muito perigoso, vejo-o também bastante desprovido de sentido lógico,
ademais de ser totalmente carente de espírito lúdico. E, não raro, pergunto-me:
quando realmente se começa a viver? No ato da concepção, como querem alguns
religiosos? Quando se vem à luz? À luz baça das salas de parto das modernas
maternidades ou do turvo recanto do tugúrio onde nascem os pobres? Ou seria
quando se recebe aquela palmada na bunda? Quando se atinge a idade adulta? E
essa última interrogação nos leva fatalmente à outra: quando é mesmo que se
atinge essa idade?
A vida (ou o ato de viver) é algo tão
insensato que quando se sai da infância e se caminha para a idade adulta o
jovem, amiúde, enlouquece completamente.
É a famosa adolescência, quando se
cometem os mais completos desatinos. Quando são ensaiados os primeiros atos
relacionados com aquilo que chamamos (ou imaginamos ser) amor.
Ocasião em que, quase sempre, se toma as
atitudes mais absurdas, algumas próxima à demência, como se estivesse antevendo
que o que vem pela frente será terrível.
Aliás, quando digo que “o que vem pela frente será terrível”,
não estou usando apenas força de expressão. Se a passagem da infância para a
fase mais adulta da vida é sempre pontilhada de quase tragédias, a vida madura
(ainda que não tenha muita certeza em que momento isso ocorre e o que vem a ser
isso) é também repleta de surpresas nem sempre agradáveis; de desencontros; de
tropeços e de constantes levantar e partir em busca de novos equilíbrios, mas,
quase sempre, indo-se ao chão novamente.
Isso, porém, já é a velhice e esta é uma
tragédia patética e sem volta. Como é difícil – oh, infernos! – envelhecer.
Principalmente é difícil envelhecer – sem envilecer – quando se sente a
falência dos músculos e se continua sentindo o vigor dos desejos que nos
extravasa do coração.
E, embora o coração não esteja murcho, outras partes do corpo – mais
úteis e prazerosas de se usar – estão irremediavelmente mortas. Não se enganem
os desavisados, isso nada tem a ver com essa falácia de “espírito jovem”. De que serve ter esse “espírito jovem” se já não se tem vigor físico para sustentá-lo?
Quando se diz que se é jovem de espírito ou se está enganando ou se
está confundindo (no caso, a si próprio). Porque isso é apenas o desejo que nos
arde no coração, sonhando com o vigor de órgãos e músculos que nos abandona
inexoravelmente.
Como é doloroso se desejar amar e já não ter vigor para fazê-lo...
Que não me venham com compensações do tipo “o coração não envelhece”, porque aí reside a maior das desgraças.
Porque se o coração envelhecesse, pari passu, com os demais órgãos, em
particular, com os outros músculos – e mui especialmente, aqueles ligados ao
sexo – a velhice não seria a desgraça tão desgraçada que é.
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