segunda-feira, 29 de setembro de 2014

HUMANITAS Nº 28 - OUTUBRO DE 2014 - PÁGINA 4

Quem é Frei Betto e qual é o apito que ele toca?

Ivo S. G. Reis – Campo Grande/MS

Bem, primeiramente, há que se saber que pessoas o som do apito dele chama e quem são os que conseguem ouvi-lo, pois nem todos os sons são audíveis ao ouvido humano e outros, apesar de audíveis, melhor negócio se faz se os ignorarmos ou taparmos os ouvidos. Eu, por exemplo, jamais atenderia a um chamado do apito de Frei Betto, assim como várias outras pessoas coerentes.
Frei Betto é um respeitado intelectual brasileiro. Escritor religioso dominicano, teólogo, ativista social e político de esquerda "adepto da Teologia da Libertação, é militante de movimentos pastorais e sociais, tendo ocupado a função de assessor especial do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2003 e 2004. [...] Foi coordenador de Mobilização Social do programa Fome Zero" (Wikipédia). Escreveu 53 livros, dois deles agraciados com os prêmios Jabuti e Juca Pato. Sua obra premiada e mais conhecida é "Batismo de Sangue", depois transformada em filme.
Um currículo respeitável, mas não suficiente para aceitarmos tudo o que ele diz, quando mistura seus valores religiosos em sua literatura e, mais ainda, quando se declara defensor da relação colaborativa Igreja Católica-Estado. Aí o bicho pega e a casa cai. Isso invalida seus méritos de intelectual, escritor e ativista social?
Certamente que não, mas restringe seu público-alvo. E entre esses não se situam os ateus e irreligiosos, que condenam veementemente a perniciosa união Igreja e Estado, que equivale à união "Igreja x Política", que dá no mesmo e nunca produz bons resultados para os dominados, isto é, o povo.
O padre (ateu) Jean Meslier, lá por 1720, já denunciava e condenava essa relação nefasta. E de lá para cá, as coisas não mudaram, apenas sofisticaram-se e intensificaram-se. São sempre as mesmas consequências: maior poder de dominação para o Estado e a Religião.
Vou dar um exemplo hipotético: Suponhamos que exista um sociólogo e historiador, sobrevivente da Segunda Guerra Mundial, mas que na época apoiava o nazismo e que hoje se identifica como simpatizante do neonazismo, apesar de não ser um ativista.
Suponhamos que esse escritor e sociólogo e historiador seja reconhecido como "o maior historiador do século 21". Suponhamos, a seguir, que ele tenha escrito um clássico denominado "História das Grandes Guerras e Conflitos dos séculos XX e XXI" e que esse livro fosse altamente festejado pela crítica e até ganhasse alguns prêmios...
Vocês confiariam na versão dele? Poderiam dizer que ela seria verdadeira e imparcial? Pode até ser que sim (os anos mudam as pessoas, inclusive suas convicções religiosas e políticas).
Porém, se o cara ainda se reconhece como simpatizante do neonazismo...
Assim é como vejo o papel social do Frei Betto e de suas obras. Como agravante, o fato dele ser um formador de opinião e apologista religioso. E as passagens a seguir destacadas endossam com vigor minhas assertivas. Uma pessoa, um escritor religioso que apoia a união Igreja-Estado, mesmo quando ele ressalva (talvez para disfarçar suas posições religiosas):
"... Não creio no deus dos torturadores e dos protocolos oficiais, no deus dos anúncios comerciais e dos fundamentalistas obcecados; no deus dos senhores de escravos e dos cardeais que louvam os donos do capital. Nesse sentido, também sou ateu."
E depois se atrapalha quando afirma crer no:
"...Deus da Arca de Noé, dos cavalos de fogo de Elias, da baleia de Jonas. Deus que extrapola a nossa fé, discorda de nossos juízos e ri de nossas pretensões; enfada-se com nossos sermões moralistas e diverte-se quando o nosso destempero profere blasfêmias."
Não, esse cara eu olho com reservas, muitas reservas. Ainda bem que pelo menos ele reconheceu "os cardeais que louvam os donos do capital".
Como, depois disso tudo, pode continuar apoiando a Igreja, se ela também louva e se associa com os donos do capital, sendo ela mesma um deles?
Teria Frei Betto esquecido como foi formada a riqueza e todo o patrimônio da Igreja Católica? Nós não.

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