sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

HUMANITAS Nº 54 – DEZEMBRO 2016 –PÁGINA 5

Patrulhamento ideológico sobre a atividade docente

Especial para o Humanitas

Paulo Alexandre é mestre em História. Mora e ensina no Recife/PE

O famigerado Programa Escola sem Partido é amparado numa absurda justificativa de combate à ideologização educacional – como se educação fosse uma atividade desprovida de bases ideológicas – que, contraditoriamente, é amparado em uma perspectiva ideológica.
Posiciona-se contra a doutrinação, mas prevê a doutrina da mordaça e o tolhimento da autonomia da atividade docente.
Claro que fazer apologia partidária, proselitismo religioso ou militância de movimento político no ambiente escolar e no processo formativo dos jovens é uma postura digna de críticas e certamente é uma prática que deve ser coibida pontualmente, quando ocorrer e quando for devidamente configurada a prática. 
Mas o que surge com esse “movimento” não é isso, e sim uma atuação generalizante de enquadrar ideias e posturas ideológicas que não agradam aos promotores dessa perspectiva.
Já há efeitos dessa mentalidade em propostas de criminalização de ideias e, óbvio, de enquadramento de professores.
A censura estúpida apregoada como postura a ser implantada e imposta nas escolas virou proposta de alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) através de um Projeto de Lei do senador Magno Malta.
Esse projeto é lastreado por justificativas insustentáveis fora do aspecto meramente opinativo e – obviamente – ideológico e doutrinário do próprio patrocinador da proposta legal.
Ele contém erros crassos como o emprego da ideia ultrapassada de “opção sexual” (aludindo ao fato de que professores podem induzir “opções sexuais”), bem como do princípio de que a escola deve  promover parâmetros morais e religiosos sob a incrível alegação de que não há moralidade fora da religião.
Pelo projeto, escolas e professores estarão sujeitos a um incessante patrulhamento de suas posturas e não apenas de suas atividades por meio de “julgamentos” fundamentados em parâmetros ideológicos.
Isso é,  obviamente, uma contradição absurda se a alegada proposta de instituir o Programa Escola sem Partido tem como objetivo o “combate à ideologização”.
Na prática, a proposta gera um ambiente antidemocrático e limitado para o processo educacional
  Não cumpre a falsa promessa de lidar com a ideologização, uma vez que é claramente ideológico e obscurantista
Já houve um tempo em que o obscurantismo ideológico vigiava nossas escolas. Não podemos aceitar o retorno disso.
Não podemos impedir que a escola seja um ambiente para a discussão de ideias, para a valorização e respeito ao amplo espectro de diversidades, para a construção de tolerância e convivência construtiva. Esse projeto é o oposto a tudo isso.
Somos contra a instauração da “mordaça educacional”.

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