quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Crendices do homem


 Editorial do HUMANITAS - Julho/2013
Crenças são invenções humanas advindas de suas necessidades. Nos primórdios da civilização não existiam outros recursos com os quais os homens pudessem suprir as angústias vividas. Assim a humanidade criou as crenças como recurso para aliviá-la da ansiedade pela busca de respostas aos mistérios naturais. O interessante é que cada grupo humano compreende os mistérios de acordo com os recursos naturais existentes em seu habitat. Tudo porque cada um habitou espaço geográfico diferente e desenvolveu um sistema de crença diferente.
Desde a origem da humanidade até hoje muita crendice desapareceu, assim como milenares superstições, rituais, costumes. Atualmente é impossível classificar paralelamente as crenças, pois todas as já praticadas partiram do princípio do sistema cultural de uma época.
As culturas que apareceram na história da humanidade apresentam, desde seus primórdios, fortes vínculos com as crenças e figuras simbólicas representadas por deuses, astros, homens, animais, ou quaisquer outros objetos que pudessem servir como representação concreta à imaginação.
Nos povoados pré-históricos, seus habitantes, crendo na existência de fenômenos sobrenaturais, sentiam-se ameaçados por essas forças e passaram a desenvolver rituais e práticas crendo na possibilidade de contato entre o homem e o sobrenatural. Usando tais mecanismos estariam de par a par com os deuses e deixariam de correr o risco de serem punidos por explorar a natureza de maneira errônea.
Assim, desenvolveram símbolos, significados e valores místicos institucionalizando, a partir disso, sistemas de crenças e rituais. No processo evolutivo desses sistemas para adoração do sobrenatural, ou melhor, dos deuses da natureza, os homens primitivos institucionalizaram o que conhecemos como “religião”. 
Como diz M. Ortega, “as religiões são sinais de identidade, tanto das pessoas como das sociedades. Por isso são tão variadas e têm, ao mesmo tempo, tantas coisas em comum”. Com o passar dos anos, os deuses foram gradativamente perdendo o reino da abstração primitiva e começando a apresentar novas faces na vida concreta, ganhando também novas representações.
Essas representações criadas pelo homem incluíam fama, beleza, ciência, medicina, sem esquecer o poder divino das substâncias farmacológicas e narcóticas, alcançando a psicologia de hoje e os livros de auto-ajuda. Com as novas respostas dadas pela ciência aparecem agora novos candidatos prontos para assumir o trono do deus recém-eliminado. Esses também prometem alternativas menos sacrificantes para que o homem possa conquistar o “bem-estar” eterno. 
Tudo muito simples. Nada complicado. O mal-estar tem nome: a incerteza quanto à vida, o medo de morrer. Ele é inerente à espécie humana. Como o homem não possui capacidade mágica de eliminar essa incerteza e esse medo, utiliza mecanismos inconscientes que se identificam com as representações simbólicas inseridas nas sociedades e nas culturas, sendo estas representações que enriquecem nosso ego de forma que possam nos ajudar a esquivar nosso corpo e nossa mente do medo e da dor do existir.

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