quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Todos nós ainda somos escravos

Texto de Jorge Oliveira de Almeida – Rio de Janeiro/RJ
Publicado no HUMANITAS nº 15 – Outubro/2013

Indo certo dia ao centro da cidade fiquei deslumbrado ao ver ao longe uma composição férrea: trem novinho em folha, brilhante, veloz. Lembrou-me uma reportagem publicada há pouco numa revista de grande circulação, sobre o industrial Eike Batista, onde uma fotografia apresentava um automóvel importado luxuosíssimo estacionado em sua sala de estar. Fiquei imaginando quanto tempo um cidadão comum, um trabalhador normal, levaria para angariar fortuna de tamanho vulto. É claro que somente uma vida não seria suficiente para consegui-lo. Quiçá duas ou três e provavelmente muito mais que isso. Mesmo que um trabalhador não gastasse nada do que recebesse durante toda a sua vida, jamais conseguiria atingir aquele estado de abastança. Como terá conseguido o Sr. Eike?
O que ocorre nesses casos, o que leva algumas pessoas (e são muitas!) a possuírem muito mais do que precisariam ter, em detrimento de milhões de outras que nada tem? A explicação está na exploração da mais-valia, que constitui a diferença entre aquilo que o trabalhador produz a duras penas e o que lhe é devolvido em forma de salário ou remuneração, o que não deixa de ser uma forma sutil de exploração e mesmo de escravidão. O grosso do que é produzido fica nas mãos dos patrões, que são os empresários, industriais, latifundiários etc.
Imagino as vidas de nababos levadas pelos grandes industriais, grandes investidores (que só investem quando o lucro é certo e garantido pelo governo) e outros que tais: residências nos melhores pontos da cidade com serviçais a lhes atenderem todos os desejos, carros luxuosíssimos, filhos alienados vivendo uma vida de artificialidades e eventualmente matando um mendigo aqui, outro ali, apenas com o propósito de divertirem-se ou provocando arruaças e brigas em boates (porque sabem muito bem que a lei não os atinge).
Para eles a vida é o que menos conta. Não seria maravilhoso se pudéssemos desfrutar de um sistema político, onde representantes capacitados e honestos trabalhassem pelo bem comum? Não seria o ideal? Em vez disso o que temos é um sistema onde a "igualdade" se mede pelo tamanho dos bolsos, onde todos aqueles que se julgam "cidadãos" estão mais preocupados em obter vantagens no país através do "jeitinho", onde todos são honestos até que se apresente uma oportunidade para delinquir, oportunidade esta muitas vezes prometida pelos políticos em troca de votos, mas não de soluções para os problemas do povo.
Assim, pus-me a conjecturar sobre a possibilidade de termos um sistema político ideal, mas tal infelizmente não é factível, porque o homem (teria preferido digitar um "agá" maiúsculo!), apoiado por sistemas religiosos que existiram e existem em simbiose com o Poder, está sempre na ânsia de querer mais e mais e mais, e para isso não se vexa de explorar o seu semelhante.
Poder-se-ia pensar que uma revolução pudesse dar novos rumos a essas maquinações maquiavélicas para a exploração do homem, mas a experiência nos mostra que uma revolução tem vida efêmera, não durando mais que cinquenta anos, porque ao fim desse tempo uma nova elite social já alcançou o poder e não está mais comprometida com antigos ideais. Essa nova elite passa a olhar o povo de cima, esquecendo-o totalmente e forçando-o a uma nova revolução, que muitas vezes funciona mais como um tiro no pé.
Na antiga União Soviética, planos quinquenais eram estabelecidos, de forma a propulsionar o desenvolvimento da nação e melhorar o nível de vida de seus cidadãos; entretanto, dadas as dificuldades pelas quais passava aquele conjunto de países (juntamente com os seus satélites), que eram torpedeados por todos os meios (inclusive pelo Vaticano), a capacidade de produção era limitada porque os recursos investidos pelo Estado não eram suficientes e os trabalhadores, que deixaram de estar conscientes de sua participação no Estado, viviam uma espécie de letargia que lhes convinha enormemente, porque não viam o porquê de fazer esforço maior em prol da nação, uma vez que o seu trabalho estava garantido.
Como consequência, os relatórios apresentados pelos responsáveis pela produção eram alinhavados para que pudessem fazer crer à cúpula da nação que as metas haviam sido atingidas, ou seja, era um jogo de faz de conta, onde ninguém queria expor suas mazelas. O Estado considerava que tudo estava bem, e na realidade tudo estava bem mal!
Chegamos à conclusão que enquanto o homem continuar sugando o sangue de seu semelhante, continuaremos a assistir ao espetáculo deprimente da exposição de carrões de alto luxo nas salas de estar das elites do Poder. 
Simplesmente vergonhosa essa forma de exploração, que ocorre com o beneplácito de todos os explorados (inconscientes naturalmente de sua condição), com a conivência e a participação da Igreja (e demais religiões), que deveria ser a primeira a levantar-se contra essa ignomínia!

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