Texto de Antônio
Carlos Gomes – Médico – Guarujá/SP
publicado no HUMANITAS nº 13 – Agosto/2013
A necessidade de sobreviver faz a vida
passar encolhida, quase oculta, para não dizer desconhecida. Muitas vezes
estamos tão preocupados que nos esquecemos de olhá-la com o devido respeito, e
aí ela se encolhe, diminui e, anônima, não nos dá, por não poder compartilhar,
o prazer que devíamos receber em retribuição.
Outras vezes, apenas assistimos o viver sem possibilidade de compartilhá-lo, ou por preguiça ou por falta absoluta de meios e, mesmo com nossas ideias fervilhando, estas ficam tímidas jogadas num canto de nossos desejos.
Há um ano o jornalista Rafael Rocha, a quem conhecíamos da rede Cultura & Humanismo (www.culturahumana.ning.com) nos lançou um desafio. Reunir pessoas de várias áreas que escreviam, tanto pelo amor à escrita ou por profissão, e propôs que fosse lançado um jornal: Humanitas. Uma jornada difícil, mas aceita, e que faz hoje, neste agosto, aniversário festivo e recompensador.
Fazer um jornal alternativo, apesar de ser um sonho é tarefa árdua. Estamos na era da internet. A comunicação, antes feita através da fala e gestos de seres em sua comunidade, encontrou o jornal, o cinema, a televisão e, hoje, ao contrário de seu início, é instantânea. Liga o mundo pelo computador mostrando em tempo real o que acontece.
Não nos interessavam as notícias de crimes e catástrofes em tempo real, mas sim a discussão de ideias. Não que os colaboradores tivessem uma ideia homogênea e única, o que é impossível para os seres humanos sabidamente individuais, mas cada um com seu pensar e sua experiência de vida tinha um ângulo diferente de analisar o que se passa no planeta.
A comunicação de massas, que se iniciou através dos jornais, logo partiu para a defesa de interesses de grupos que tentavam dominar a sociedade. As leis não conseguiram conter a ânsia de dominação do humano pelo humano.
Em 1993, Paul Virilio, no livro A Arte do Motor (L'art du moteur), escreveu este texto, que permanece válido à comunicação contemporânea: “Os meios de comunicação industriais se beneficiam de uma singular depravação das leis democráticas. Efetivamente, se a televisão e, por osmose, a imprensa, não gozam, a priori, da liberdade de anunciar notícias falsas, nossa legislação lhes concede por outro lado o poder exorbitante de mentir por omissão, censurando e vetando aqueles que não lhes convêm ou possam prejudicar seus interesses”.
E continua: “O quarto poder – e ainda é adequado chamá-lo assim – é, portanto a única de nossas instituições capaz de funcionar fora de qualquer controle democrático eficaz, já que toda crítica independente dirigida contra ele, toda solução alternativa, permanecem desconhecidas do grande público, simplesmente porque não têm nenhuma chance de serem amplamente difundidas e, consequentemente, de atingirem este público.”
Como se sabe a Sociedade Humana está em constante modificação; em nosso tempo, aparentemente, as mudanças estão aceleradas, uma vez que a estrutura de parentesco que sempre a norteou está desfeita em grandes e médios centros. O hábito de pessoas conversarem entre si em sua comunidade, com a agitação dos dias atuais onde as “obrigações” anularam o tempo de convívio se perdeu, fez com que nos tornássemos refém dos meios de comunicação tradicionais.
Sabendo, desde Aristóteles, que a sociedade é como uma casa e cada humano é uma pedrinha que orientará o desenho e a estrutura, o domínio perverso das comunicações leva a uma homogeneização de ideias e, consequentemente, o poder econômico guia a estrutura social para onde lhe dará mais lucro, ficando a sociedade refém dos meios de divulgação e doutrinação.
A proposta do Humanitas é exatamente a de proporcionar aos leitores uma visão diferente da orientação padrão do capital. Pode parecer tímida, mas não o é. Vem como resgate do tempo em que as pessoas tinham o hábito de se reunir e cada uma narrar com detalhes suas ideias e a maneira que imaginavam uma sociedade melhor, para si e seus descendentes.
É bom notar que a sociedade dirigida pelo Capital não apresenta variantes, citando mais uma vez Virilio, a sociedade está exposta a 1.500 emissões publicitárias por dia, sempre em interesse do Mercado. Marcel Pagnol, também citado, faz interessante reflexão: “No teatro com mil espectadores, cada pessoa vê a peça de acordo com o ângulo que está posicionado. Na verdade cada um acaba vendo o espetáculo à sua maneira. Com a câmera de filmagem há uma homogeneização e cada qual verá exatamente igual ao outro. É como se somente um espectador visse toda a encenação”.
É exatamente o que os meios de comunicação usam para uniformizar opiniões, vender seus produtos, e formar opiniões tanto de consumo, como de meios de governo, atendendo a seus interesses. O uso da tecnologia transforma a população em uma unidade a ser manipulada. Não há outras opções. Estão formando uma sociedade individual, incutindo interesses e desejos estranhos às pessoas, e, assim, vão levando a humanidade, enfrentando-a de modo violento, enquanto essa população dirigida tenta corrigir o rumo natural da civilização. Podemos notar que, de 1968 para cá, vem contecendo revoltas sucessivas em várias partes do planeta que, mesmo contidas, não são extintas, reaparecendo em outro ponto. Concomitante a essas manifestações vemos o número gritante de desajustados sociais, consequência lógica de uma sociedade fictícia, tornando seus membros drogados ou partindo para o crime com carga cada vez maior de agressividade e lesão à sociedade como um todo.
O Humanitas está de parabéns pelo seu aniversário. Rafael Rocha e os colaboradores, mesmo diante das dificuldades monetária e de divulgação vêm conseguindo levar a diferentes pontos, dentro e fora do Brasil, uma visão em outro ângulo de nosso caminhar na sociedade e, assim, apresentar novas formas de ver os problemas e suas diferentes apresentações de modo a criar um campo de frutífero debate, que, certamente, formará núcleos de orientação, ajudando o caminhar de nossa sociedade tão manipulada por um sistema perverso de dominação.
Humanitas: parabéns pelo seu aniversário!
Marcel Pagnol (Aubagne, 28 de fevereiro de 1895 – Paris, 18 de abril de 1974) foi um dramaturgo e cineasta francês, membro da Academia Francesa de Letras).
Outras vezes, apenas assistimos o viver sem possibilidade de compartilhá-lo, ou por preguiça ou por falta absoluta de meios e, mesmo com nossas ideias fervilhando, estas ficam tímidas jogadas num canto de nossos desejos.
Há um ano o jornalista Rafael Rocha, a quem conhecíamos da rede Cultura & Humanismo (www.culturahumana.ning.com) nos lançou um desafio. Reunir pessoas de várias áreas que escreviam, tanto pelo amor à escrita ou por profissão, e propôs que fosse lançado um jornal: Humanitas. Uma jornada difícil, mas aceita, e que faz hoje, neste agosto, aniversário festivo e recompensador.
Fazer um jornal alternativo, apesar de ser um sonho é tarefa árdua. Estamos na era da internet. A comunicação, antes feita através da fala e gestos de seres em sua comunidade, encontrou o jornal, o cinema, a televisão e, hoje, ao contrário de seu início, é instantânea. Liga o mundo pelo computador mostrando em tempo real o que acontece.
Não nos interessavam as notícias de crimes e catástrofes em tempo real, mas sim a discussão de ideias. Não que os colaboradores tivessem uma ideia homogênea e única, o que é impossível para os seres humanos sabidamente individuais, mas cada um com seu pensar e sua experiência de vida tinha um ângulo diferente de analisar o que se passa no planeta.
A comunicação de massas, que se iniciou através dos jornais, logo partiu para a defesa de interesses de grupos que tentavam dominar a sociedade. As leis não conseguiram conter a ânsia de dominação do humano pelo humano.
Em 1993, Paul Virilio, no livro A Arte do Motor (L'art du moteur), escreveu este texto, que permanece válido à comunicação contemporânea: “Os meios de comunicação industriais se beneficiam de uma singular depravação das leis democráticas. Efetivamente, se a televisão e, por osmose, a imprensa, não gozam, a priori, da liberdade de anunciar notícias falsas, nossa legislação lhes concede por outro lado o poder exorbitante de mentir por omissão, censurando e vetando aqueles que não lhes convêm ou possam prejudicar seus interesses”.
E continua: “O quarto poder – e ainda é adequado chamá-lo assim – é, portanto a única de nossas instituições capaz de funcionar fora de qualquer controle democrático eficaz, já que toda crítica independente dirigida contra ele, toda solução alternativa, permanecem desconhecidas do grande público, simplesmente porque não têm nenhuma chance de serem amplamente difundidas e, consequentemente, de atingirem este público.”
Como se sabe a Sociedade Humana está em constante modificação; em nosso tempo, aparentemente, as mudanças estão aceleradas, uma vez que a estrutura de parentesco que sempre a norteou está desfeita em grandes e médios centros. O hábito de pessoas conversarem entre si em sua comunidade, com a agitação dos dias atuais onde as “obrigações” anularam o tempo de convívio se perdeu, fez com que nos tornássemos refém dos meios de comunicação tradicionais.
Sabendo, desde Aristóteles, que a sociedade é como uma casa e cada humano é uma pedrinha que orientará o desenho e a estrutura, o domínio perverso das comunicações leva a uma homogeneização de ideias e, consequentemente, o poder econômico guia a estrutura social para onde lhe dará mais lucro, ficando a sociedade refém dos meios de divulgação e doutrinação.
A proposta do Humanitas é exatamente a de proporcionar aos leitores uma visão diferente da orientação padrão do capital. Pode parecer tímida, mas não o é. Vem como resgate do tempo em que as pessoas tinham o hábito de se reunir e cada uma narrar com detalhes suas ideias e a maneira que imaginavam uma sociedade melhor, para si e seus descendentes.
É bom notar que a sociedade dirigida pelo Capital não apresenta variantes, citando mais uma vez Virilio, a sociedade está exposta a 1.500 emissões publicitárias por dia, sempre em interesse do Mercado. Marcel Pagnol, também citado, faz interessante reflexão: “No teatro com mil espectadores, cada pessoa vê a peça de acordo com o ângulo que está posicionado. Na verdade cada um acaba vendo o espetáculo à sua maneira. Com a câmera de filmagem há uma homogeneização e cada qual verá exatamente igual ao outro. É como se somente um espectador visse toda a encenação”.
É exatamente o que os meios de comunicação usam para uniformizar opiniões, vender seus produtos, e formar opiniões tanto de consumo, como de meios de governo, atendendo a seus interesses. O uso da tecnologia transforma a população em uma unidade a ser manipulada. Não há outras opções. Estão formando uma sociedade individual, incutindo interesses e desejos estranhos às pessoas, e, assim, vão levando a humanidade, enfrentando-a de modo violento, enquanto essa população dirigida tenta corrigir o rumo natural da civilização. Podemos notar que, de 1968 para cá, vem contecendo revoltas sucessivas em várias partes do planeta que, mesmo contidas, não são extintas, reaparecendo em outro ponto. Concomitante a essas manifestações vemos o número gritante de desajustados sociais, consequência lógica de uma sociedade fictícia, tornando seus membros drogados ou partindo para o crime com carga cada vez maior de agressividade e lesão à sociedade como um todo.
O Humanitas está de parabéns pelo seu aniversário. Rafael Rocha e os colaboradores, mesmo diante das dificuldades monetária e de divulgação vêm conseguindo levar a diferentes pontos, dentro e fora do Brasil, uma visão em outro ângulo de nosso caminhar na sociedade e, assim, apresentar novas formas de ver os problemas e suas diferentes apresentações de modo a criar um campo de frutífero debate, que, certamente, formará núcleos de orientação, ajudando o caminhar de nossa sociedade tão manipulada por um sistema perverso de dominação.
Humanitas: parabéns pelo seu aniversário!
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Virilio,
Paul – A Arte do Motor (L'art du moteur) - Tradução de Paulo Roberto
Pires - Estação Liberdade, 1996, é um filósofo,
francês, arquiteto, polemista, pesquisador e autor de vários livros sobre as
tecnologias da comunicação. Marcel Pagnol (Aubagne, 28 de fevereiro de 1895 – Paris, 18 de abril de 1974) foi um dramaturgo e cineasta francês, membro da Academia Francesa de Letras).
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