quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Insulto à cultura e à evolução do povo brasileiro

Texto de Ricardo Augusto Bezerra Tiné – Pesquisador – Guaraí/TO
Publicado no HUMANITAS nº 02 – Outubro/2012
A língua verdadeira do povo brasileiro tem origem e evolução totalmente diversa das línguas faladas na Península Ibérica.


No ano de 1500 chega à costa brasileira três caravelas com cerca de 180 homens de pouca ou nenhuma instrução. Dentre eles, Pero Vaz de Caminha, o único que sabia ler e escrever. Ao invadirem o Brasil trouxeram consigo uma língua apenas falada que era a evolução e o aproveitamento de tantas outras línguas das quais tiveram contato na Península Ibérica. Ao se depararem com os nativos brasileiros, cerca de 5 milhões só na Costa Atlântica da América do Sul, conseguiram comunicação gestual, pois nada entendiam e nada se fazia entender nessa primeira situação de contato entre línguas distintas. Como eram insignificantes em matéria de cultura na região foram obrigados naturalmente a aprender a língua tupinambá, dominante entre os nativos. 
Nessa mesma época, em Portugal, depois de sucessivas invasões germanas, árabes, romanas dentre outras, o mosaico linguístico resultante dessas interferências deu origem a um tipo de língua chamada de galego-romanço, ou seja, nada que se possa comparar com o que se estabeleceu atualmente como língua portuguesa. As línguas primitivas da Península Ibérica tiveram contato direto com as diversas línguas invasoras, e, de maneira concreta, podem pertencer a qualquer dessas famílias linguísticas germanas, romanas ou arábicas. No entanto, a língua verdadeira do povo brasileiro tem origem e evolução totalmente diversa da acima descrita.
Em Portugal, a primeira gramática escrita na língua portuguesa foi elaborada em 1536 por Fernão de Oliveira. Ela não surtiu o efeito desejado, pois lá se dava valor aos estudos do romanço, que nada mais era do que a mistura do galego com o latim vulgar. O Rei Dom Manuel precisou emitir um Alvará-Régio, em 30 de setembro de 1770, obrigando os jesuítas a ensinarem por um período de seis meses a dita língua portuguesa aos portugueses.
Antes mesmo do reconhecimento da necessidade de se ensinar a língua portuguesa para os portugueses (1770), a coroa portuguesa reconheceu no Brasil uma situação que já existia de fato e de direito e por meio da Carta-Régia de 30 de novembro de 1689, oficializou a língua brasileira e determinou seu ensino para todos que moravam ou viessem a morar no Brasil. No dia 3 de maio do ano de 1757 outro Alvará-Régio foi emitido, direcionado à farsa impossível de ser cumprida. Esse novo alvará tinha a intenção de tentar apagar e calar a língua brasileira em prol da portuguesa. 
“Observando pois todas as nações polidas do mundo esse prudente e sólido sistema de se implantar nos povos conquistados a língua do Príncipe, nesta conquista se praticou pelo contrário, pois só cuidavam os primeiros conquistadores estabelecer nela o uso da língua, que chamamos geral, invenção verdadeiramente abominável e diabólica”. 
Essas determinações de nada adiantaram pois para cada analfabeto português que aqui chegou, existiam vinte falantes da nova língua brasileira. Como não obteve êxito algum em terras brasileiras, esse último alvará foi extinto pela Carta-Régia de 12 de maio de 1798, voltando ao status natural do uso geral da língua brasileira. 
Dois elementos nocivos e devastadores para a formação de uma democracia devem ser extirpados do seio da sociedade que se intitula Democrática de Direito. Esses elementos quando atuam em separado produzem efeitos desagregadores e injustos no convívio social.
O primeiro deles é a pretensão autoritária de pequenos grupos políticos que utilizam determinadas prerrogativas constitucionais para cometer toda forma de crime contra os direitos e garantias do cidadão e do patrimônio público. O segundo, e mais perigoso ainda, pois dele se alimenta o primeiro, é a inércia da sociedade, vista como organismo principal na formação de uma Nação.
Como referência da manutenção dessa relação desastrosa encontra-se a língua portuguesa, oficializada no Brasil mesmo antes de se ter oficializado uma língua nacional.
Esse apagamento cultural, evidentemente, serve como duto canalizador de toda pretensão da ditadura política, bem como de toda a alienação coletiva brasileira.
Fazer parte de uma comunidade como a CPLP, que agrupa em seu núcleo seis países subdesenvolvidos, Portugal e Brasil, não pode trazer benefício algum para uma Nação que é a sexta economia mundial. 
Se isso não fosse suficiente para desautorizar esse acordo internacional, temos a situação espúria de professores brasileiros que não podem lecionar língua portuguesa nas faculdades estrangeiras porque Portugal, simplesmente, não reconhece os certificados de proficiência emitidos pelo governo brasileiro. Os livros de gramática da língua portuguesa elaborados por brasileiros também não são aceitos como livros didático-pegagógicos nos sete países dessa comunidade. Se esses fatos não se configuram em crimes contra a cultura e contra o povo brasileiro, o que então seria crime de lesa-pátria?

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