sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

O Expresso do Oriente

Texto de Antonio Carlos Gomes – Médico – Guarujá/SP
publicado no HUMANITAS nº 02 – Outubro/2012

Na adolescência tinha três sonhos. Um realizável a qualquer hora: era conhecer Paris; desinteressei-me no caminho, mas pode ser que ainda resolva ir. Outro seria procurar o Mestre no Himalaia, atualmente impossível, por falta de preparo físico. O terceiro é andar no Expresso do Oriente. Este sonho continua se metamorfoseando em minha mente, sempre presente e atual.
A fantasia envolve esta linha que não sabemos o trajeto, numa paisagem que desconhecemos, com funcionários de bordo sempre enigmáticos e passageiros de todos os tipos, desde mulheres lindas e apaixonadas, a ladrões de carteira amores e bagagens, espiões, policiais e as tramas que tomam forma no trem, quando anda correndo as estepes desconhecidas, acompanhado de mongóis primitivos, em seus cavalos velozes prontos a fazer justiça em seu território.
Tanto na realidade, como na ficção dezenas de filmes e noticias foram relatados, e neles cada vez mais minha imaginação viajava pelas estepes.
Do louco amor pela mulher encantadora que abandonara o marido e o suicídio deste após uma violenta depressão, seguida de descontrole.
O aventureiro com pouco dinheiro que teve sua carteira roubada e, se tornou serviçal para poder comer. O espião que buscava o segredo que o inimigo levava e lutou com todos os riscos para cumprir sua missão. O governante que levava um grupo, em assembleia, para decidir leis que protegessem a população. Tudo, com o chefe de trem atento e controlando com discrição, não interferindo nos amores e nas dores de seus viajantes, mas firme, decidindo a solução final.
Mas nas noticias e nos filmes nunca vi o maquinista. Será que tem um?
Nunca também vi a estação que encerra a linha. Todos param alegres ou fracassados nas estações intermediárias; não se vê noticias do final da linha. Teria o trem um destino?
Sim, realmente este trem ficou martelando toda minha vida até hoje, ele faz parte de minha imaginação.
Mas hoje não mais quero ir às estepes para andar no luxuoso trem, nem correr o risco de em vez de passageiro me tornar lavador de privadas e faxineiro dos vagões. Dispenso os amores não imagináveis que ele pode me dar. Não quero ver espiões e inspetores na mais emocionante ação. Não quero as reuniões para resolver os problemas de um povo. Não! Não quero mais ir a este trem.
Hoje, com a vida equilibrada, quero manter-me quieto e sereno, com a vida sem maquinista e sem estação final, apenas com estações intermediarias e cheias de imprevistos do Expresso do Oriente.

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