Ricardo Tiné –
Pesquisador – Guaraí/TO
publicado no HUMANITAS nº 03 – Outubro/2012
publicado no HUMANITAS nº 03 – Outubro/2012
Nem nas colônias portuguesas havia possibilidade
de salvar
a língua portuguesa como se fala em Portugal
Em 1946 elegeu-se no Brasil uma Assembleia
Constituinte na qual, como em todos os outros grandes acontecimentos do nosso
passado, reapareceu o problema da nossa autonomia linguística. Em um gesto
louvável da compreensão de seu papel em nosso destino cultural, deliberou
aquela Assembleia indicar ao Governo Federal a necessidade de uma comissão
técnica para colaborar com ela na denominação justa da língua que falamos.
A nossa Assembleia Constituinte não quis agir por conta própria em tudo. Reconheceu no problema de nossa língua o lado especial da competência dos técnicos. Daí a sua iniciativa de autorizar o Governo Federal a nomear uma comissão mista de gramáticos, professores, jornalistas, escritores, que desse, cada qual dentro da sua experiência, parecer sobre a matéria. Pela sua natureza mesma, essa comissão poderia chegar, ou não, a um resultado seguro. A Assembleia não se omitiria da prerrogativa de legisladora, para sancionar ou não, o parecer – decisivo ou não – da comissão.
O Governo Federal encaminhou o caso para o Ministério da Educação, cujo titular (Raul Leitão da Cunha), perturbando a marcha normal das coisas, desviou o destino da resolução da Assembleia Constituinte, ainda vigente, e, sem se importar com a extensão e com a complexidade do problema (intencionalmente, decerto), convidou alguns senhores de seu convívio. Sucedeu, porém, que finda sua tarefa, essa comissão estarreceu a nação inteira com uma unanimidade e uma brevidade alarmantes. Em sete dias essa comissão resolveu que a língua falada no Brasil é a língua portuguesa e portuguesa é que deve se chamar. Seguiu-se a isso um pesado silêncio de toda a nação brasileira.
A nossa Assembleia Constituinte não quis agir por conta própria em tudo. Reconheceu no problema de nossa língua o lado especial da competência dos técnicos. Daí a sua iniciativa de autorizar o Governo Federal a nomear uma comissão mista de gramáticos, professores, jornalistas, escritores, que desse, cada qual dentro da sua experiência, parecer sobre a matéria. Pela sua natureza mesma, essa comissão poderia chegar, ou não, a um resultado seguro. A Assembleia não se omitiria da prerrogativa de legisladora, para sancionar ou não, o parecer – decisivo ou não – da comissão.
O Governo Federal encaminhou o caso para o Ministério da Educação, cujo titular (Raul Leitão da Cunha), perturbando a marcha normal das coisas, desviou o destino da resolução da Assembleia Constituinte, ainda vigente, e, sem se importar com a extensão e com a complexidade do problema (intencionalmente, decerto), convidou alguns senhores de seu convívio. Sucedeu, porém, que finda sua tarefa, essa comissão estarreceu a nação inteira com uma unanimidade e uma brevidade alarmantes. Em sete dias essa comissão resolveu que a língua falada no Brasil é a língua portuguesa e portuguesa é que deve se chamar. Seguiu-se a isso um pesado silêncio de toda a nação brasileira.
Descobriu-se, posteriormente, que todos os
integrantes dessa comissão convidados pelo “ministro da educação” eram pessoas
declaradamente contrárias à sobrevivência da língua brasileira como fato
nacional e à sua legitimidade como valor cultural, digno de estudo e
disciplina. Até universalidade se atribuiu à língua portuguesa. Não levaram em
conta que ilustres portugueses (vide Hipólito Raposo) lastimavam que nem nas
colônias portuguesas havia mais possibilidade de se salvar a língua portuguesa
como se fala em Portugal.
Nunca tínhamos sido, desde que existimos,
testemunhas de uma irresponsabilidade assim – decisiva, fulminante, ditatorial
– sem consulta à opinião dos brasileiros e sem respeito a nada. Tudo se
resolveu nessa comissão ministerial como se faria em uma comissão de exegetas
do alcorão.
Na verdade não houve comissão. Houve um
concílio de “deuses”, alguns deles, verdadeiras surpresas para a
Nação. Bem apuradas as coisas, essa divina
comissão decidiu repreender a Assembleia Constituinte dizendo que: “A língua falada no Brasil não é assunto
nacional. O nome dela é matéria privativa do governo português que nos dá
regras de ortografia enfeitadas de comendas.”
A comissão ministerial não discutiu, não documentou, não ofereceu margem a comentário. Sua unanimidade, a sua ausência de qualquer dúvida sobre um problema secular, a sua omissão de fatos e fatores do Brasil, a sua serena ignorância sobre dezenas de teses sobre o assunto e de todo o movimento nativista que conta mais de um século, as suas descabidas alusões a categorias gramaticais em princípio, o seu absolutismo histórico etc, deram a essa tal comissão um tom especial de soberania, de magnitude, de eternidade, que tornaram o seu parecer algo divino, acima das prerrogativas da Assembleia Constituinte, modesta demais para falar sobre matéria de tamanha envergadura.
Agora, se o legislativo quiser saber algo sobre o assunto, tem que se reportar ao Ministério da Educação para pedir uma cópia de sua portaria-decreto em que a sua comissão “divina” deliberou que não cabe a ninguém no Brasil resolver sobre assunto privativo da nação portuguesa, pois a tanto importa perguntar o nome da língua falada em nossa terra por (na época) 45 milhões de brasileiros livres. Na Constituinte de 1988 a questão da nossa língua foi tratada com o mesmo descaso que na anterior.
A comissão ministerial não discutiu, não documentou, não ofereceu margem a comentário. Sua unanimidade, a sua ausência de qualquer dúvida sobre um problema secular, a sua omissão de fatos e fatores do Brasil, a sua serena ignorância sobre dezenas de teses sobre o assunto e de todo o movimento nativista que conta mais de um século, as suas descabidas alusões a categorias gramaticais em princípio, o seu absolutismo histórico etc, deram a essa tal comissão um tom especial de soberania, de magnitude, de eternidade, que tornaram o seu parecer algo divino, acima das prerrogativas da Assembleia Constituinte, modesta demais para falar sobre matéria de tamanha envergadura.
Agora, se o legislativo quiser saber algo sobre o assunto, tem que se reportar ao Ministério da Educação para pedir uma cópia de sua portaria-decreto em que a sua comissão “divina” deliberou que não cabe a ninguém no Brasil resolver sobre assunto privativo da nação portuguesa, pois a tanto importa perguntar o nome da língua falada em nossa terra por (na época) 45 milhões de brasileiros livres. Na Constituinte de 1988 a questão da nossa língua foi tratada com o mesmo descaso que na anterior.
Proclama o filólogo português Vasco Botelho
do Amaral (veja texto extraído do livro “A
Questão da Língua Brasileira” de Herbert Parente Fortes, 1957, pag. 45, 46
e 47), que a língua é uma só – para o
Brasil e Portugal. Deste país recebeu o nome. Com ele se formou. Para ele vive.
Com ele evoluiu e atingiu os cimos da cultura. Povo e cultura são
indissociáveis. A língua
portuguesa está cheia de alma lusitana.
É imortalizada em monumentos imperecíveis. Trazida para cá não traiu a sua gente nem perdeu o seu gênio. Está intacta.
Agora, nem o céu nem a terra juntos farão que ela deixe de ser o que é. A língua portuguesa é e será a
língua do Brasil literário. E só este conta.
Essa é a razão verdadeira da manutenção da língua
portuguesa em nosso território. Essa é a podridão escondida por trás dos
decretos e leis que empurram de goela adentro uma farsa sem cabimento nem
sustentação. Quem está ganhando dinheiro com essa podridão linguística? Por que
não se resolve essa questão com um plebiscito?
Nenhum comentário:
Postar um comentário